segunda-feira, julho 31, 2006
primeiros poemas # 18
# 18
esta noite
,enquanto esperava por uma trovoada que nunca chegou a celebrar-se
,caí por uma ravina à beira da cama
..........corri as cortinas da janela
e pus-me a pensar na metamorfose das borboletas
e na filosofia das abelhas
não cheguei a conclusão nenhuma mas pensar nisso
acalmou-me a dor física de ter caído
e de raspão ter ferido a mão direita
pensar na metamorfose das borboletas
ou na filosofia das abelhas
acalma-me sempre – qualquer dor
deitei-me outra vez..........,já sem poder dormir
e li até me chorarem os olhos a música de mozart
ler a música de mozart é como pensar na metamorfose das borboletas
ou na filosofia das abelhas
dorido da queda
,segui aquela missa natural
,mentindo a mim próprio afirmando a elevação do meu espírito
e julguei-me..........,finalmente
,livre de ser cordeiro
..........na paz secreta da comunhão e da absolvição
..........livre da culpa
..........,da minha tão grande culpa
com a luz apagada e o dia ainda por nascer
peguei no rosário japonês que um velho mestre me ofereceu
e recitei até não ter dedos as palavras sagradas
da sobrevivência:
kyrie eleison – christi eleison – kyrie eleison
:foi como se não tivesse caído da ravina
e me tivesse posto a voar por dentro de toda a infelicidade
até fechar os olhos e com calor ser feliz
esta noite
,enquanto esperava por uma trovoada que nunca chegou a celebrar-se
,caí por uma ravina à beira da cama
..........corri as cortinas da janela
e pus-me a pensar na metamorfose das borboletas
e na filosofia das abelhas
não cheguei a conclusão nenhuma mas pensar nisso
acalmou-me a dor física de ter caído
e de raspão ter ferido a mão direita
pensar na metamorfose das borboletas
ou na filosofia das abelhas
acalma-me sempre – qualquer dor
deitei-me outra vez..........,já sem poder dormir
e li até me chorarem os olhos a música de mozart
ler a música de mozart é como pensar na metamorfose das borboletas
ou na filosofia das abelhas
dorido da queda
,segui aquela missa natural
,mentindo a mim próprio afirmando a elevação do meu espírito
e julguei-me..........,finalmente
,livre de ser cordeiro
..........na paz secreta da comunhão e da absolvição
..........livre da culpa
..........,da minha tão grande culpa
com a luz apagada e o dia ainda por nascer
peguei no rosário japonês que um velho mestre me ofereceu
e recitei até não ter dedos as palavras sagradas
da sobrevivência:
kyrie eleison – christi eleison – kyrie eleison
:foi como se não tivesse caído da ravina
e me tivesse posto a voar por dentro de toda a infelicidade
até fechar os olhos e com calor ser feliz
primeiros poemas # 17
# 17
toda a natureza esfria no horizonte
como se um tribunal divino tivesse decidido
congelar a alegria de se ser triste e natural
deus não compreende que ser poeta não é uma decisão
é como chuva ou vento............:emana
de uma alegria profunda que só a dor permite
deus não escuta
...........não vê
deus não escuta e não vê porque não nasceu
só criou e criar é a morte da criação
,do olhar
,do horizonte
? como serão por dentro as pessoas que seguem este deus criador
,ignorante
,mudo e desprovido de qualquer vidência
? que gente é esta que assiste impávida ao desaparecimento
gelado da natureza envés de olhar o sol e a sua luz
........sem metafísica
........sem matemática
...............só geometria
é incrível que ainda haja quem confunda a geometria com a matemática
ou a metafísica com a essência do ser que é a única existência que não tem essência
deus está condenado à eternidade porque não pode morrer
não pode morrer porque só pode morrer aquilo que nasce
e por isso tem raiva de tudo
e se vinga com as suas leis ignóbeis
ordenando príncipe um asqueroso pederasta nazi chamado moisés
e recusando a presença de cristo por não suportar que seja humano e gerado
como qualquer criança que é fruto de um ventre
a natureza esfria no horizonte
perante a imobilidade senil desse deus menor
toda a natureza esfria no horizonte
como se um tribunal divino tivesse decidido
congelar a alegria de se ser triste e natural
deus não compreende que ser poeta não é uma decisão
é como chuva ou vento............:emana
de uma alegria profunda que só a dor permite
deus não escuta
...........não vê
deus não escuta e não vê porque não nasceu
só criou e criar é a morte da criação
,do olhar
,do horizonte
? como serão por dentro as pessoas que seguem este deus criador
,ignorante
,mudo e desprovido de qualquer vidência
? que gente é esta que assiste impávida ao desaparecimento
gelado da natureza envés de olhar o sol e a sua luz
........sem metafísica
........sem matemática
...............só geometria
é incrível que ainda haja quem confunda a geometria com a matemática
ou a metafísica com a essência do ser que é a única existência que não tem essência
deus está condenado à eternidade porque não pode morrer
não pode morrer porque só pode morrer aquilo que nasce
e por isso tem raiva de tudo
e se vinga com as suas leis ignóbeis
ordenando príncipe um asqueroso pederasta nazi chamado moisés
e recusando a presença de cristo por não suportar que seja humano e gerado
como qualquer criança que é fruto de um ventre
a natureza esfria no horizonte
perante a imobilidade senil desse deus menor
domingo, julho 30, 2006
primeiros poemas # 16
# 16
em dias de transparência exacta
..........como louco alucinado
vejo o tejo a navegar em círculos
entre os muros desta cidade seca
e enterrada – pudesse eu não ser um louco alucinado
e ver
..........realmente
o tejo
..........a navegar em círculos
entre os muros de évora
e à noite passear junto às estreitas praias fluviais
ou sentar-me num cais de colunas
que por milagre
se formasse junto à sé ou no rossio
ou mesmo junto às arcadas da praça dos penitentes
hoje está um dia de transparência exacta e
..........como louco alucinado
vi o tejo a navegar em círculos
entre os muros desta cidade seca
e enterrada – pudesse eu ser mesmo um louco alucinado
e ver em dias de transparência exacta
..........como um louco alucinado
o tejo
a navegar em círculos
entre os muros desta cidade seca
e enterrada
em dias de transparência exacta
..........como louco alucinado
vejo o tejo a navegar em círculos
entre os muros desta cidade seca
e enterrada – pudesse eu não ser um louco alucinado
e ver
..........realmente
o tejo
..........a navegar em círculos
entre os muros de évora
e à noite passear junto às estreitas praias fluviais
ou sentar-me num cais de colunas
que por milagre
se formasse junto à sé ou no rossio
ou mesmo junto às arcadas da praça dos penitentes
hoje está um dia de transparência exacta e
..........como louco alucinado
vi o tejo a navegar em círculos
entre os muros desta cidade seca
e enterrada – pudesse eu ser mesmo um louco alucinado
e ver em dias de transparência exacta
..........como um louco alucinado
o tejo
a navegar em círculos
entre os muros desta cidade seca
e enterrada
sábado, julho 29, 2006
primeiros poemas # 15
# 15
nunca soube nada de estrelas
nem da organização com que ornamentam as noites
mas houve um tempo em que aprendi a reconhecer uma constelação
uma única
a única constelação que seria capaz de distinguir no céu
estivesse eu habitando seja lá em que hemisfério fosse
aprendi o mapa dessa constelação sentado numa pedra tumular
junto a um sonho que se desfez como a poeira
celeste se desfaz em limalhas de ouro
lá
onde os deuses habitam dentro do sol
perdi o mapa dessa constelação
perdi o mapa desse sonho
perdi as limalhas de sol que os deuses me oferendaram
hoje olho o céu e as estrelas voltaram
a ganhar o ar caótico que tinham quando era criança
e criança
olhava o céu nocturno
............já não sou criança e deixei de acreditar
............no poder das estrelas e
............dos sonhos e
............os mapas das constelações são
............como água escorrendo do meu cérebro por um chão inclinado
essa pedra tumular onde me sentei
ainda lá está
à espera
de outras pessoas
de outros olhares
do desenho de novos mapas
quem me dera ser eu a pedra
quem me dera ser eu o túmulo
ou limalha celeste na mão de um pequeno deus solar
............mas nunca o que sonha
nunca soube nada de estrelas
nem da organização com que ornamentam as noites
mas houve um tempo em que aprendi a reconhecer uma constelação
uma única
a única constelação que seria capaz de distinguir no céu
estivesse eu habitando seja lá em que hemisfério fosse
aprendi o mapa dessa constelação sentado numa pedra tumular
junto a um sonho que se desfez como a poeira
celeste se desfaz em limalhas de ouro
lá
onde os deuses habitam dentro do sol
perdi o mapa dessa constelação
perdi o mapa desse sonho
perdi as limalhas de sol que os deuses me oferendaram
hoje olho o céu e as estrelas voltaram
a ganhar o ar caótico que tinham quando era criança
e criança
olhava o céu nocturno
............já não sou criança e deixei de acreditar
............no poder das estrelas e
............dos sonhos e
............os mapas das constelações são
............como água escorrendo do meu cérebro por um chão inclinado
essa pedra tumular onde me sentei
ainda lá está
à espera
de outras pessoas
de outros olhares
do desenho de novos mapas
quem me dera ser eu a pedra
quem me dera ser eu o túmulo
ou limalha celeste na mão de um pequeno deus solar
............mas nunca o que sonha
sexta-feira, julho 28, 2006
primeiros poemas # 14
# 14
acordei a meio da tarde com uma imensa
vontade de rezar a uma santa qualquer – vontade de
pedir-lhe por mim
pelos outros – todos os outros que ninguém sabe quem são
e que por isso são só «outros» – vontade de
dizer pais-nossos sem parar até à hora do luar
mas fumei um cigarro
toquei num pequeno tambor índio
e perdi todo o fulgor intenso de orar
depois senti desejo de ler
e ainda peguei num livro e li as três primeiras linhas
mas a pensar em andorinhas e em chá
de lúcia-lima – fumei outro cigarro
voltei a tocar o tambor índio
e perdi o fulgor intenso de ler
antes de me levantar e começar a sentir calor e
com as pálpebras fechadas sentir a realidade a escapar-se com
o andar brutal do relógio – olhei uma fotografia
por cima da cama – uma fotografia de jesus
abraçado a buda num local que dizem que existe
a que os teósofos chamam shambala
quando olhei a fotografia já me sentia doente
............ou demasiado são
e olhando aqueles dois seres num amplexo amoroso
como se fosse o último beijo entre eles
senti uma compaixão profunda por eles e
decepção por mim
que dor disfarçada escondem os sorrisos dos
instrutores do mundo – voltei a sentir o ímpeto de orar
.....pedir a nossa senhora que velasse por aquelas criaturas
que de já não sofrerem ficaram paralisadas num sorriso apóstolo
que não significa nada
não sei porquê
talvez seja a efabulação enlouquecida a que estou preso
mas senti que a minha prece à mãe do mundo
tinha sido escutada e que algo de calmo
tinha voado da minha cama em pensamento
num voo de auxilio redondo e luz perfeita
em direcção a essa shambala que dizem que existe
procurando e encontrando aqueles homens abraçados
a tempo de não os deixar morrer a morte
da separação e do abandono
por fim levantei-me e senti-me do tamanho
de um punho fechado
um coração – graças a deus que sou vazio
e não sei pensar com o juízo profundo
dos filósofos e dos poetas
do tamanho de um punho fechado
um coração
vivo a doença eterna de nada poder fazer
que não seja orar com a mesma linguagem
invertida com que um deus reza a si próprio pedindo clemência
acordei a meio da tarde com uma imensa
vontade de rezar a uma santa qualquer – vontade de
pedir-lhe por mim
pelos outros – todos os outros que ninguém sabe quem são
e que por isso são só «outros» – vontade de
dizer pais-nossos sem parar até à hora do luar
mas fumei um cigarro
toquei num pequeno tambor índio
e perdi todo o fulgor intenso de orar
depois senti desejo de ler
e ainda peguei num livro e li as três primeiras linhas
mas a pensar em andorinhas e em chá
de lúcia-lima – fumei outro cigarro
voltei a tocar o tambor índio
e perdi o fulgor intenso de ler
antes de me levantar e começar a sentir calor e
com as pálpebras fechadas sentir a realidade a escapar-se com
o andar brutal do relógio – olhei uma fotografia
por cima da cama – uma fotografia de jesus
abraçado a buda num local que dizem que existe
a que os teósofos chamam shambala
quando olhei a fotografia já me sentia doente
............ou demasiado são
e olhando aqueles dois seres num amplexo amoroso
como se fosse o último beijo entre eles
senti uma compaixão profunda por eles e
decepção por mim
que dor disfarçada escondem os sorrisos dos
instrutores do mundo – voltei a sentir o ímpeto de orar
.....pedir a nossa senhora que velasse por aquelas criaturas
que de já não sofrerem ficaram paralisadas num sorriso apóstolo
que não significa nada
não sei porquê
talvez seja a efabulação enlouquecida a que estou preso
mas senti que a minha prece à mãe do mundo
tinha sido escutada e que algo de calmo
tinha voado da minha cama em pensamento
num voo de auxilio redondo e luz perfeita
em direcção a essa shambala que dizem que existe
procurando e encontrando aqueles homens abraçados
a tempo de não os deixar morrer a morte
da separação e do abandono
por fim levantei-me e senti-me do tamanho
de um punho fechado
um coração – graças a deus que sou vazio
e não sei pensar com o juízo profundo
dos filósofos e dos poetas
do tamanho de um punho fechado
um coração
vivo a doença eterna de nada poder fazer
que não seja orar com a mesma linguagem
invertida com que um deus reza a si próprio pedindo clemência
primeiros poemas # 13
# 13
? teremos
nós estado
despidos e deitados......,numa praia......,um verão
? foram nossos os corpos que se dilataram nas
águas retraídas onde nos beijámos
hoje tudo isto me cheira a aneurisma
a embuste cerebral
a veneno
tenho lembranças.............,é verdade
.............(véus sinistros a devorar-me os lábios)
? sou um selenita com alucinações de mar
? um esqueleto sidérico com suposições de ter amado ao sol
falta-me pele...........,doença
............,um aquário de peixes de água doce –
talvez uma gaiola onde pudesse guardar um pássaro empalhado
............e pôr-lhe alpista e água fresca todas as manhãs
falta-me uma lembrança em que pudesse acreditar
um álbum de fotografias
um chapéu antigo que posto me aliviasse da explosão iminente
da cabeça a gemer como um tractor no outeiro
? teremos
nós estado
despidos e deitados......,numa praia......,um verão
? foram nossos os corpos que se dilataram nas
águas retraídas onde nos beijámos
hoje tudo isto me cheira a aneurisma
a embuste cerebral
a veneno
tenho lembranças.............,é verdade
.............(véus sinistros a devorar-me os lábios)
? sou um selenita com alucinações de mar
? um esqueleto sidérico com suposições de ter amado ao sol
falta-me pele...........,doença
............,um aquário de peixes de água doce –
talvez uma gaiola onde pudesse guardar um pássaro empalhado
............e pôr-lhe alpista e água fresca todas as manhãs
falta-me uma lembrança em que pudesse acreditar
um álbum de fotografias
um chapéu antigo que posto me aliviasse da explosão iminente
da cabeça a gemer como um tractor no outeiro
terça-feira, julho 25, 2006
primeiros poemas # 12
# 12
eu..........,que sou menos que uma pedra,...........(o
que não é difícil porque uma pedra traz em si o espírito de todo um universo)
recuso a filosofia
e proclamo a religião,
.........que por ser religião não tem nome
.........nem pastor nem tristeza nem alegria
.........nem amor nem ódio nem leveza
.........nem trovoadas nem chuvas nem sol
.........nem nada do que possa cair do céu
.........ou vir do fundo da terra – ao contrário
:proclamo a religião porque a religião é todas estas coisas
juntas num único laço fazendo de nós um verso
a escorrer pelo aparo da caneta
a filosofia tem nome
pastor e tristeza e alegria
e amor e ódio e leveza
,trovoadas...........,chuvas...........,sol
e absorve tudo o que do céu é caído e tudo quanto d
o fundo da terra é erguido
mas a filosofia exige que pensemos no seu nome
que sigamos ou rejeitemos o pastor
exige que pensemos no amor
............,na tristeza e na alegria
exige que pensemos nas trovoadas
...........,nas chuvas
...........,no sol
e nas coisas abençoadas que caem do céu ou se erguem da terra
nomear uma coisa é querer possuí-la
e pensarmos nelas é já as termos perdido
,aceitar ou rejeitar é nunca sentir nada
pensar é abandonar o corpo e agarrar o lastro de tudo o que já foi com a cabeça
...........– é não ter pele –
proclamo a religião e quando a filosofia me assalta
sinto apenas a sua presença e deixo-a passar
como faria num sonho perante a presença maligna de um espírito morto
eu..........,que sou menos que uma pedra,...........(o
que não é difícil porque uma pedra traz em si o espírito de todo um universo)
recuso a filosofia
e proclamo a religião,
.........que por ser religião não tem nome
.........nem pastor nem tristeza nem alegria
.........nem amor nem ódio nem leveza
.........nem trovoadas nem chuvas nem sol
.........nem nada do que possa cair do céu
.........ou vir do fundo da terra – ao contrário
:proclamo a religião porque a religião é todas estas coisas
juntas num único laço fazendo de nós um verso
a escorrer pelo aparo da caneta
a filosofia tem nome
pastor e tristeza e alegria
e amor e ódio e leveza
,trovoadas...........,chuvas...........,sol
e absorve tudo o que do céu é caído e tudo quanto d
o fundo da terra é erguido
mas a filosofia exige que pensemos no seu nome
que sigamos ou rejeitemos o pastor
exige que pensemos no amor
............,na tristeza e na alegria
exige que pensemos nas trovoadas
...........,nas chuvas
...........,no sol
e nas coisas abençoadas que caem do céu ou se erguem da terra
nomear uma coisa é querer possuí-la
e pensarmos nelas é já as termos perdido
,aceitar ou rejeitar é nunca sentir nada
pensar é abandonar o corpo e agarrar o lastro de tudo o que já foi com a cabeça
...........– é não ter pele –
proclamo a religião e quando a filosofia me assalta
sinto apenas a sua presença e deixo-a passar
como faria num sonho perante a presença maligna de um espírito morto
primeiros poemas # 11
# 11
bebo chá –
o chá é uma parte do céu
e o céu são folhas de chá aninhadas
no fundo de uma chávena
beber chá faz-nos perceber que não há memória no mundo
que tudo é visível e presente como os pés
ou os cabelos – quando bebo chá e olho o céu
entra-me na pele um vento cheio de terra
afundando-me o coração e o cérebro
num cimento de jardim cheio de mar
onde repouso oculto porque sem coração
e sem cérebro
sou tão nobre
e alto
e intocável
como um grande rochedo dos himalaias
ou uma laranjeira
num quintal
bebo chá porque bebendo chá
me aproximo de todas as coisas divinas da existência
com a certeza de que na existência não há nada de divino
bebo chá porque bebendo chá
nasce em mim a clarividência irrefutável
de que o misticismo é a única coisa solar
que a terra transporta e que sendo o misticismo transportado pela terra
não há nada mais verdadeiramente real que uma chávena de chá
bebo chá –
o chá é uma parte do céu
e o céu são folhas de chá aninhadas
no fundo de uma chávena
beber chá faz-nos perceber que não há memória no mundo
que tudo é visível e presente como os pés
ou os cabelos – quando bebo chá e olho o céu
entra-me na pele um vento cheio de terra
afundando-me o coração e o cérebro
num cimento de jardim cheio de mar
onde repouso oculto porque sem coração
e sem cérebro
sou tão nobre
e alto
e intocável
como um grande rochedo dos himalaias
ou uma laranjeira
num quintal
bebo chá porque bebendo chá
me aproximo de todas as coisas divinas da existência
com a certeza de que na existência não há nada de divino
bebo chá porque bebendo chá
nasce em mim a clarividência irrefutável
de que o misticismo é a única coisa solar
que a terra transporta e que sendo o misticismo transportado pela terra
não há nada mais verdadeiramente real que uma chávena de chá
domingo, julho 23, 2006
primeiros poemas # 10
# 10
dominó
é domingo
escrevo-te esta carta no único dia
em que sei que ela não pode seguir
isso acalma-me
não poderei enviar
não a irás ler… uma carta enviada
é uma carta lida...........mesmo que nunca chegue
canasta
à sombra das tílias..........,dia
primeiro de um agosto ainda em julho
lisboa cheia de humidade
toques de sineta
........alguma missa
........alguma padaria a anunciar pão fresco
ver-te é já não te ver
ter-te........,então........,é como o cair d
as cartas no pano verde de jogo,
… um valete
… ? de espadas
,copas que desaparecem
numa simples jogada de reis
sobre o centro – ? damas – ! nada
silencioso fico para trás
a sombra das tílias…
prefiro o dominó a desfazer-se branco e negro
batido sobre a dor do mármore na taberna…
… com isto......,a febre......,esqueci-me do que tinha para te dizer
mas era urgente…
… ? amor –
é domingo e isso basta
a carta não seguirá – tu não a lerás
e eu hei-
-de adormecer a
o som de um sincopado batimento de tambor
dominó
é domingo
escrevo-te esta carta no único dia
em que sei que ela não pode seguir
isso acalma-me
não poderei enviar
não a irás ler… uma carta enviada
é uma carta lida...........mesmo que nunca chegue
canasta
à sombra das tílias..........,dia
primeiro de um agosto ainda em julho
lisboa cheia de humidade
toques de sineta
........alguma missa
........alguma padaria a anunciar pão fresco
ver-te é já não te ver
ter-te........,então........,é como o cair d
as cartas no pano verde de jogo,
… um valete
… ? de espadas
,copas que desaparecem
numa simples jogada de reis
sobre o centro – ? damas – ! nada
silencioso fico para trás
a sombra das tílias…
prefiro o dominó a desfazer-se branco e negro
batido sobre a dor do mármore na taberna…
… com isto......,a febre......,esqueci-me do que tinha para te dizer
mas era urgente…
… ? amor –
é domingo e isso basta
a carta não seguirá – tu não a lerás
e eu hei-
-de adormecer a
o som de um sincopado batimento de tambor
sábado, julho 22, 2006
primeiros poemas # 9
# 9
parecia tão largo e
plano
o mundo
pareciam tão largas as árvores
e altas – as flores enormes e carmim –
agora a natureza ficou do tamanho dos meus olhos
..........já só vejo pelos olhos
nunca observei um cometa mas sentia-os a biliões
de anos luz – sentia-lhes o gelo das caudas
e a estrela de olhos muito abertos............:a cabeça
,navegando no escuro de galáxias prestes a nascer
mais que o sol
mais que a lua
sentia os cometas em visões corpóreas
...........tinha o corpo desperto
para as visões mais profundas e
,por dentro..........,os órgãos vulneráveis
,como se pássaros me habitassem
o amor era universal
incondicional e transversal
– agora a universalidade do cosmo
ganhou este tamanho circular
pouco maior
que o ovo
ocular que tenho preso entre os dentes
sou um peixe vermelho num pequeno lago
cheio de budas e anjos-são-raphael
às voltas
cuspindo
segundos de um encantamento antigo
peixe
nadando
entre asas e mantras que jamais te trarão de volta
parecia tão largo e
plano
o mundo
pareciam tão largas as árvores
e altas – as flores enormes e carmim –
agora a natureza ficou do tamanho dos meus olhos
..........já só vejo pelos olhos
nunca observei um cometa mas sentia-os a biliões
de anos luz – sentia-lhes o gelo das caudas
e a estrela de olhos muito abertos............:a cabeça
,navegando no escuro de galáxias prestes a nascer
mais que o sol
mais que a lua
sentia os cometas em visões corpóreas
...........tinha o corpo desperto
para as visões mais profundas e
,por dentro..........,os órgãos vulneráveis
,como se pássaros me habitassem
o amor era universal
incondicional e transversal
– agora a universalidade do cosmo
ganhou este tamanho circular
pouco maior
que o ovo
ocular que tenho preso entre os dentes
sou um peixe vermelho num pequeno lago
cheio de budas e anjos-são-raphael
às voltas
cuspindo
segundos de um encantamento antigo
peixe
nadando
entre asas e mantras que jamais te trarão de volta
primeiros poemas # 8
# 8
vi deus e disse-lhe que o tinha amado
até este dia em que ele se me mostrou
deus quis revelar-se para estabelecer em mim a fé
e o amor a ele............,mas deus,
este deus de sempre...........,que nos contempla
sem nunca saber o que fazer – enganou-se
............mais uma vez
nem de deus poderia esperar-se outra coisa –
e eu amava-o tanto
eu era deus
e deus eu – deus andava comigo a toda a hora
e a toda a hora eu com deus
e a minha vida era toda uma oração nova
e silenciosa
deus e eu éramos um corpo erguido da terra
com raízes e tronco e folhas e frutos
hoje vi deus e disse-lhe que o tinha amado
mas que agora já não o poderia amar
vi-o e todo o meu ser se despiu dele
tê-lo visto foi ter de deixá-lo
deus chorou............,arrependeu-se
,pediu desculpa daquela forma desequilibrada
que tem sempre ,obcecado que é
com a ideia do perdão e eu tive pena
e quis voltar a amá-lo.............,mas
já não era possível
........não o culpo de nada
........por isso seria ridículo desculpá-lo
........não lhe quero mal nenhum......,porque é imperfeito
........como um arco-íris a quem falta uma cor
só já não o consigo amar
,nem tê-lo comigo a toda a hora
porque tendo ele mostrado ao meu espírito
a sua pequena face, o seu minúsculo corpo
e a tibieza da sua voz,.............mostrou-se
sobre-humano............,antinatural
transcendente e dependente da fé
e aquilo que deus nunca soube é que a fé é o contrário do amor
na despedida............,por piedade
,a única coisa que consegui foi o dever de ser gentil
:que paz do senhor esteja consigo
vi deus e disse-lhe que o tinha amado
até este dia em que ele se me mostrou
deus quis revelar-se para estabelecer em mim a fé
e o amor a ele............,mas deus,
este deus de sempre...........,que nos contempla
sem nunca saber o que fazer – enganou-se
............mais uma vez
nem de deus poderia esperar-se outra coisa –
e eu amava-o tanto
eu era deus
e deus eu – deus andava comigo a toda a hora
e a toda a hora eu com deus
e a minha vida era toda uma oração nova
e silenciosa
deus e eu éramos um corpo erguido da terra
com raízes e tronco e folhas e frutos
hoje vi deus e disse-lhe que o tinha amado
mas que agora já não o poderia amar
vi-o e todo o meu ser se despiu dele
tê-lo visto foi ter de deixá-lo
deus chorou............,arrependeu-se
,pediu desculpa daquela forma desequilibrada
que tem sempre ,obcecado que é
com a ideia do perdão e eu tive pena
e quis voltar a amá-lo.............,mas
já não era possível
........não o culpo de nada
........por isso seria ridículo desculpá-lo
........não lhe quero mal nenhum......,porque é imperfeito
........como um arco-íris a quem falta uma cor
só já não o consigo amar
,nem tê-lo comigo a toda a hora
porque tendo ele mostrado ao meu espírito
a sua pequena face, o seu minúsculo corpo
e a tibieza da sua voz,.............mostrou-se
sobre-humano............,antinatural
transcendente e dependente da fé
e aquilo que deus nunca soube é que a fé é o contrário do amor
na despedida............,por piedade
,a única coisa que consegui foi o dever de ser gentil
:que paz do senhor esteja consigo
quarta-feira, julho 19, 2006
primeiros poemas # 7
# 7
nem amor ou qualquer afecto
tudo o que sou e sinto é ser e sentir
sou um devedor
sou aquele que nasceu para a curva da estrada
sou o que cruza as pernas
..........por ter sido educado a respeitar a cruz das pernas
tenho uns anéis…
três...........,que uso sempre,
(e uns outros que ponho quando me julgo despido)
– no mindinho...........,uma aliança de prata
,onde um ourives embutiu flores-de-lis de ouro –
ligação a u
m divino amo
r que não responde – irmandade muda e perdida –
no majestoso anular esquerdo o brasão
que ilumina como um círio gigante as mãos de uma catedral
e
n
o
destro
uma ametista cravada...........,sagrado
............coração
..................de jesus –
compromisso na terra
com alguém-coisa que nunca vi fora de mim
mas sei vivo na ponta dos dedos: os caracteres
do poema
nem amor ou qualquer afecto
tudo o que sou e sinto é ser e sentir
sou um devedor
sou aquele que nasceu para a curva da estrada
sou o que cruza as pernas
..........por ter sido educado a respeitar a cruz das pernas
tenho uns anéis…
três...........,que uso sempre,
(e uns outros que ponho quando me julgo despido)
– no mindinho...........,uma aliança de prata
,onde um ourives embutiu flores-de-lis de ouro –
ligação a u
m divino amo
r que não responde – irmandade muda e perdida –
no majestoso anular esquerdo o brasão
que ilumina como um círio gigante as mãos de uma catedral
e
n
o
destro
uma ametista cravada...........,sagrado
............coração
..................de jesus –
compromisso na terra
com alguém-coisa que nunca vi fora de mim
mas sei vivo na ponta dos dedos: os caracteres
do poema
segunda-feira, julho 17, 2006
primeiros poemas # 6
# 6
fechei o olhar como se fossem os olhos
a porta deste derradeiro foco de infecção
que me afronta
..........,decepado
,cortado de poder beijar
sinto nos ombros o peso de tantas catedrais
e um sopro do clero a orar por mim
como se além-eu houvesse alma que se pudesse
salvar
? mas porque se hão-de salvar as almas
..........quando os corpos enfermam tanto
? consolação
! ah
! é verdade
é aos pobres de espírito que está reservado o reino celeste
nesse caso..........(que lapso..........,o meu)
,aceito a salvação da minha alma – venha o cura exorcizar-me o espírito
enquanto eu cuspo o corpo como a um sinistro lago
lembro-me de ainda há poucos anos
na infância
ter sentido uma leve esperança
...........uma pesada esperança
uma chaminé de padaria que elevava o fumo fétido da carne
para bem alto de mim – um moinho ao pé do mar
:um charco de sol que se pôs e não voltou a subir
no campo tudo é robusto
e forte e térreo – ? e que esperança têm as árvores
? a de ter alma
? a de ganhar o reino dos céus
fechei o olhar como se fossem os olhos
a porta deste derradeiro foco de infecção
que me afronta
..........,decepado
,cortado de poder beijar
sinto nos ombros o peso de tantas catedrais
e um sopro do clero a orar por mim
como se além-eu houvesse alma que se pudesse
salvar
? mas porque se hão-de salvar as almas
..........quando os corpos enfermam tanto
? consolação
! ah
! é verdade
é aos pobres de espírito que está reservado o reino celeste
nesse caso..........(que lapso..........,o meu)
,aceito a salvação da minha alma – venha o cura exorcizar-me o espírito
enquanto eu cuspo o corpo como a um sinistro lago
lembro-me de ainda há poucos anos
na infância
ter sentido uma leve esperança
...........uma pesada esperança
uma chaminé de padaria que elevava o fumo fétido da carne
para bem alto de mim – um moinho ao pé do mar
:um charco de sol que se pôs e não voltou a subir
no campo tudo é robusto
e forte e térreo – ? e que esperança têm as árvores
? a de ter alma
? a de ganhar o reino dos céus
domingo, julho 16, 2006
primeiros poemas # 5
# 5
se o amor fosse um copo de água o meu estaria a sangrar
líquido por fora igual líquido por dentro
e bebo o sangue porque é hora de morrer
de finalizar este pequeno troço de vida
que começou já não sei onde e agora se derrama
como um comboio que descarrila sem dar por isso
sinto o pescoço cansado deste respirar forçado
a que me obrigo sem sequer saber pará-lo
..........abro a boca e as narinas......,pouco mais
assim perdi a força para pintar
e nem descansar é possível porque até o calor quando vem é demais
enforco-me em ossos
e aqui vos faço o voto de aprender com esse mestre oculto
que vive dentro de mim........,disciplinado e severo
..........,ainda nem tinha nascido
(e que me ensina a toda a hora o quão vã é a minha forma de amar)
de me sentar no sentar de lótus com que se levita e
ejectar a minha consciência para que em breve
possa renascer
e acordado ser
só
amado
se o amor fosse um copo de água o meu estaria a sangrar
líquido por fora igual líquido por dentro
e bebo o sangue porque é hora de morrer
de finalizar este pequeno troço de vida
que começou já não sei onde e agora se derrama
como um comboio que descarrila sem dar por isso
sinto o pescoço cansado deste respirar forçado
a que me obrigo sem sequer saber pará-lo
..........abro a boca e as narinas......,pouco mais
assim perdi a força para pintar
e nem descansar é possível porque até o calor quando vem é demais
enforco-me em ossos
e aqui vos faço o voto de aprender com esse mestre oculto
que vive dentro de mim........,disciplinado e severo
..........,ainda nem tinha nascido
(e que me ensina a toda a hora o quão vã é a minha forma de amar)
de me sentar no sentar de lótus com que se levita e
ejectar a minha consciência para que em breve
possa renascer
e acordado ser
só
amado
quarta-feira, julho 12, 2006
primeiros poemas # 4
# 4
o calor paralisa-me mas o calor só me paralisa
porque penso que o calor me paralisa
e eu penso que o calor me paralisa e paraliso
suando e sofrendo do mal inevitável que é sofrer
tenho uma ventoinha a brincar-me nas orelhas
e uma pedra a pesar-me no peito
e outra nos pés
foi-se a noite ainda a lua não subiu ao seu pleno
o dia não chegou a existir porque o passei a dormir
a noite não existirá porque a passarei a dormir
a vida será breve porque a passarei a dormir
e tudo isto sem nunca ter sabido adormecer
sem nunca ter sonhado
tendo sempre estado na vigília cansada das memórias estúpidas
na uma ilusão confusa a que chamei amor
bebo água
chá
olho para o relógio e no relógio para os ponteiros e finjo
acreditar na verdade da sua rotação como um pensamento
igual por dentro a um olhar para fora
todo eu sou igual a qualquer dor
só que com menos perfeição
o calor paralisa-me mas o calor só me paralisa
porque penso que o calor me paralisa
e eu penso que o calor me paralisa e paraliso
suando e sofrendo do mal inevitável que é sofrer
tenho uma ventoinha a brincar-me nas orelhas
e uma pedra a pesar-me no peito
e outra nos pés
foi-se a noite ainda a lua não subiu ao seu pleno
o dia não chegou a existir porque o passei a dormir
a noite não existirá porque a passarei a dormir
a vida será breve porque a passarei a dormir
e tudo isto sem nunca ter sabido adormecer
sem nunca ter sonhado
tendo sempre estado na vigília cansada das memórias estúpidas
na uma ilusão confusa a que chamei amor
bebo água
chá
olho para o relógio e no relógio para os ponteiros e finjo
acreditar na verdade da sua rotação como um pensamento
igual por dentro a um olhar para fora
todo eu sou igual a qualquer dor
só que com menos perfeição
terça-feira, julho 11, 2006
primeiros poemas # 3
# 3
saúdo as flores tristes que lerem estes versos
saúdo todas as pedras e o olhar imóvel das árvores
........e as estradas à beira delas
saúdo as trovoadas que não chegam e por não chegarem são belas e desejadas
saúdo todas as coisas que não são amadas
........e todas aquelas que não amam
saúdo-me por fazer parte de todas estas coisas que sou
........como se todas as coisas que sou não fossem parte de mim
saúdo os deuses pequenos
........e os grandes que estão tão sós como o mais recluso dos monges
até saúdo deus apesar da sua estúpida concepção das coisas
........e da forma infeliz como concebeu mundos pelo espaço fora
........sem saber o que fazia
........nem para quem os fazia
… deus criou tudo menos as pessoas e a filosofia…
........saúdo-o
........mas com pena
........porque imagino o seu sofrimento solitário
olho para o pequeno espelho de bolso que tenho à minha frente
e concluo.....,por exclusão de partes.....,que sou gente
e sinto um súbito de desejo de ser cágado ou tartaruga
........não digo isto por dizer
sinto mesmo o desejo de envés de gente ser cágado ou tartaruga
não por ser melhor ser cágado ou tartaruga envés de ser gente
mas porque sendo cágado ou tartaruga ninguém
me reconheceria como gente
mas como cágado ou tartaruga e nunca seria interpelado
para nada que não fosse o olhar embevecido pela beleza da minha carapaça
saúdo todos os cágados e tartarugas que habitam o universo
saúdo-os pelas suas existências intemporais
e pela felicidade milagrosa de não serem gente
não ser gente é poder amar completamente
sem ter que honrar a deus e aos homens
e não esperar nada
não ser gente é poder ao fim do dia recolher a cabeça para dentro
.........da milagrosa carapaça onde se é sempre criança
acima de tudo..........,saúdo
,todos os que nos mundos do universo
não são gente e por isso podem amar livres e meninos
........dentro da carapaça poderosa de um cágado ou tartaruga
saúdo
e adormeço
envolvido pela combustão silenciosa e mortal
de um sono de gente...........,mas com a paz ilusória
de ter saudado todos os que acima e abaixo e fora de mim
rezam para ter...........,ainda nesta vida
,uma carapaça onde respirar
saúdo as flores tristes que lerem estes versos
saúdo todas as pedras e o olhar imóvel das árvores
........e as estradas à beira delas
saúdo as trovoadas que não chegam e por não chegarem são belas e desejadas
saúdo todas as coisas que não são amadas
........e todas aquelas que não amam
saúdo-me por fazer parte de todas estas coisas que sou
........como se todas as coisas que sou não fossem parte de mim
saúdo os deuses pequenos
........e os grandes que estão tão sós como o mais recluso dos monges
até saúdo deus apesar da sua estúpida concepção das coisas
........e da forma infeliz como concebeu mundos pelo espaço fora
........sem saber o que fazia
........nem para quem os fazia
… deus criou tudo menos as pessoas e a filosofia…
........saúdo-o
........mas com pena
........porque imagino o seu sofrimento solitário
olho para o pequeno espelho de bolso que tenho à minha frente
e concluo.....,por exclusão de partes.....,que sou gente
e sinto um súbito de desejo de ser cágado ou tartaruga
........não digo isto por dizer
sinto mesmo o desejo de envés de gente ser cágado ou tartaruga
não por ser melhor ser cágado ou tartaruga envés de ser gente
mas porque sendo cágado ou tartaruga ninguém
me reconheceria como gente
mas como cágado ou tartaruga e nunca seria interpelado
para nada que não fosse o olhar embevecido pela beleza da minha carapaça
saúdo todos os cágados e tartarugas que habitam o universo
saúdo-os pelas suas existências intemporais
e pela felicidade milagrosa de não serem gente
não ser gente é poder amar completamente
sem ter que honrar a deus e aos homens
e não esperar nada
não ser gente é poder ao fim do dia recolher a cabeça para dentro
.........da milagrosa carapaça onde se é sempre criança
acima de tudo..........,saúdo
,todos os que nos mundos do universo
não são gente e por isso podem amar livres e meninos
........dentro da carapaça poderosa de um cágado ou tartaruga
saúdo
e adormeço
envolvido pela combustão silenciosa e mortal
de um sono de gente...........,mas com a paz ilusória
de ter saudado todos os que acima e abaixo e fora de mim
rezam para ter...........,ainda nesta vida
,uma carapaça onde respirar
segunda-feira, julho 03, 2006
primeiros poemas # 2
# 2
olho pela janela deste quarto
vejo as folhas das tílias
e penso que realmente estou neste quarto
vendo as folhas das tílias
isto se as folhas das tílias existem
se eu existo
se o quarto existe
um poema não é nada
nem um quarto
nem umas folhas de tília
nem um cigarro que se consome numa existência invertida
ou o olho com que vejo e que me vê…
… nada
? as tílias são os pensamentos que me iludem
...........como um beijo que se deu
...........mas julgamos que não demos
...........porque a memória mistura tudo
...........e tudo é um ranger de dentes delicados
...........à beira da boca
tudo
os budistas proclamam a vacuidade última das coisas
............não percebo
? porque temos nós de compreender a vacuidade última das coisas
se há a vacuidade última das coisas
havendo a vacuidade última das coisas
habitaríamos nela a toda a hora e ela seria evidente
? como pode a vacuidade última das coisas ser algo de tão imbecil
que se esconde atrás da ilusão fingindo
que não existe a vacuidade última das coisas
só para que tenhamos de compreender a vacuidade última das coisas
olho pela janela deste quarto
constato que este quarto existe porque
vejo as tílias à beira das persianas
vejo-me a mim
sinto o ardor do cigarro a queimar-me o indicador esquerdo
e penso que em mim existe a visão de tudo
só pelo facto de neste quarto olhar pela janela
ver tílias e as poder cheirar
olho pela janela deste quarto
vejo as folhas das tílias
e penso que realmente estou neste quarto
vendo as folhas das tílias
isto se as folhas das tílias existem
se eu existo
se o quarto existe
um poema não é nada
nem um quarto
nem umas folhas de tília
nem um cigarro que se consome numa existência invertida
ou o olho com que vejo e que me vê…
… nada
? as tílias são os pensamentos que me iludem
...........como um beijo que se deu
...........mas julgamos que não demos
...........porque a memória mistura tudo
...........e tudo é um ranger de dentes delicados
...........à beira da boca
tudo
os budistas proclamam a vacuidade última das coisas
............não percebo
? porque temos nós de compreender a vacuidade última das coisas
se há a vacuidade última das coisas
havendo a vacuidade última das coisas
habitaríamos nela a toda a hora e ela seria evidente
? como pode a vacuidade última das coisas ser algo de tão imbecil
que se esconde atrás da ilusão fingindo
que não existe a vacuidade última das coisas
só para que tenhamos de compreender a vacuidade última das coisas
olho pela janela deste quarto
constato que este quarto existe porque
vejo as tílias à beira das persianas
vejo-me a mim
sinto o ardor do cigarro a queimar-me o indicador esquerdo
e penso que em mim existe a visão de tudo
só pelo facto de neste quarto olhar pela janela
ver tílias e as poder cheirar