sexta-feira, abril 28, 2006
obrigado
Glicínia Quartin
nos 80 anos de glicínia quartin
olho para a tua fotografia – o jornal é de hoje
a fotografia têm quê...40 anos...mais...menos
datas/tantas datas: gargantas engolidoras de vida
não consigo/nem saberia
ordenar
a tua
generosidade por datas mas
lembro-me dos teus olhos/da maneira irritante como
inclinas o pescoço para o lado quando queres ser doce
lembro
quase a medo
como cheiras a flores no palco
se soubesse soletrar – não é o caso
vocalizaria glicínia em suaves prestações silábicas
apesar de te saber indivisível como um odor a mãos lavadas
o teu nome parte-se em tantos e
tu em tantos nomes glicini-
a é só uma maneira de te dizer/cheirar/respirar/chamar
bem sei que não me ouves
nem isso seria possível
tantos palcos destruídos
tantas roupas rasgadas –
tantas glicínias desfeitas em palcos rasgados
penso em ti como se pensasse em letras:
pequenas manchas que justapostas formam pernas
braços uma boca gritante
uma cintura
o pescoço – de
que cor são as glicínias?
de quantos verdes és feita?
em quantos vermelhos os teus olhos arderam?
não vai nevar este inverno...sabes?
o sol será frio...isso sim é certo
mas nada de esperanças
dezembro é só dezembro
mais trânsito nas ruas
mais tristeza nos olhares
mais lágrimas que em janeiro
mais gente nas passadeiras
e o rossio parece maior
mas em lisboa dezembro é só dezembro
haverá mais um palco?
mais um texto?
mais um dia?
sobrevoam naves brancas
muitas
sobre a cidade
são aviões/julgo
vêem do céu este lugar onde chove passado
só passado
aqui como em toda a parte
o presente escoou-se em promessas
de sangue e rosas de crochet
agrafadas a vestidos negros
voltaram as fadistas as deusas-corvo
que rondam tudo
que farejam as horas esperando que cada minuto morra
para diligentes avisarem os abutres
morreram os dias
há mulheres muito gordas nos cafés
e o amor é só uma palavra com quatro letras redondas
uma cornucópia de chantily
um bolo de aniversário
é só dezembro
é só lisboa
e no jornal de hoje a tua fotografia
os teus cabelos os olhos o corpo desenhado de um desejo
impossível
como a escultura que há tantos anos
o fernando conduto fez a tua cabeça
premonição em bronze de um derradeiro palco
de um último guarda roupa
depois de hoje – finalmente – começará a vida?
será o início do sonhado e fulgurante dia
que como o sol nascerá sem projectos
sem marcações
só teatro – só espelhos?
Frederico Mira George
Abril em Maio
nos 80 anos de glicínia quartin
olho para a tua fotografia – o jornal é de hoje
a fotografia têm quê...40 anos...mais...menos
datas/tantas datas: gargantas engolidoras de vida
não consigo/nem saberia
ordenar
a tua
generosidade por datas mas
lembro-me dos teus olhos/da maneira irritante como
inclinas o pescoço para o lado quando queres ser doce
lembro
quase a medo
como cheiras a flores no palco
se soubesse soletrar – não é o caso
vocalizaria glicínia em suaves prestações silábicas
apesar de te saber indivisível como um odor a mãos lavadas
o teu nome parte-se em tantos e
tu em tantos nomes glicini-
a é só uma maneira de te dizer/cheirar/respirar/chamar
bem sei que não me ouves
nem isso seria possível
tantos palcos destruídos
tantas roupas rasgadas –
tantas glicínias desfeitas em palcos rasgados
penso em ti como se pensasse em letras:
pequenas manchas que justapostas formam pernas
braços uma boca gritante
uma cintura
o pescoço – de
que cor são as glicínias?
de quantos verdes és feita?
em quantos vermelhos os teus olhos arderam?
não vai nevar este inverno...sabes?
o sol será frio...isso sim é certo
mas nada de esperanças
dezembro é só dezembro
mais trânsito nas ruas
mais tristeza nos olhares
mais lágrimas que em janeiro
mais gente nas passadeiras
e o rossio parece maior
mas em lisboa dezembro é só dezembro
haverá mais um palco?
mais um texto?
mais um dia?
sobrevoam naves brancas
muitas
sobre a cidade
são aviões/julgo
vêem do céu este lugar onde chove passado
só passado
aqui como em toda a parte
o presente escoou-se em promessas
de sangue e rosas de crochet
agrafadas a vestidos negros
voltaram as fadistas as deusas-corvo
que rondam tudo
que farejam as horas esperando que cada minuto morra
para diligentes avisarem os abutres
morreram os dias
há mulheres muito gordas nos cafés
e o amor é só uma palavra com quatro letras redondas
uma cornucópia de chantily
um bolo de aniversário
é só dezembro
é só lisboa
e no jornal de hoje a tua fotografia
os teus cabelos os olhos o corpo desenhado de um desejo
impossível
como a escultura que há tantos anos
o fernando conduto fez a tua cabeça
premonição em bronze de um derradeiro palco
de um último guarda roupa
depois de hoje – finalmente – começará a vida?
será o início do sonhado e fulgurante dia
que como o sol nascerá sem projectos
sem marcações
só teatro – só espelhos?
Frederico Mira George
Abril em Maio