sexta-feira, fevereiro 10, 2006
tratado secreto da cidade # 38
# 38 – vigésimo oitavo dia – 38 de dezembro – évora
9h31
. estranhei nessa altura a falta que senti no peito só por saber que irias estar fora durante uns míseros quinze dias. quando voltaste da viagem trazias o brilho e o encanto das fadas e no meu peito plantaram-se sementes de cidreira e tília. odores que durante muito tempo o meu corpo misturava no sangue e no sopro, no verbo, no sémen. meu amado. quero-te tanto bem. tanta paz: meu gato invisível. não há nada de mais material que um gato etéreo. já passou muito tempo? demasiado tempo? ainda esta madrugada senti o teu corpo aninhar-se em mim na cama onde num plano outro, imenso e cerrado aos olhares profanos, posso comunicar com seres misteriosos, detentores de sabedoria, força, beleza, transparência. seres que também encontro na rua, a caminho dos seus esforços, das suas penas, sisífos arrastando as suas pedras na escalada da montanha. mas no sono de vigília que aprendi a ter, todos esses seres – o senhor do banco, a senhora da tabacaria, o motorista do táxi, o médico, aquele que anda de porta em porta de jornal na mão à procura de emprego – me aparecem em todo a sua grande glória e alvez. também tu gato, nascido não gerado, vivo não mortal, me apareces e revelas baixinho os segredos que te são permitidos revelar e que eu não decoro para te proteger do meu pensamento impuro
quando regressaste dessa viagem soube que te amaria para toda a vida. vida que acaba amanhã
o nosso amor cessa hoje,
estas palavras são a despedida. não as te
ria escrito se esta noite não me tivesses visitado e doado um silêncio tão fecundo para que tenha uma partida leve e dourada. diz-me, onde estarei amanhã depois da cessação do alento? em que cipreste? em que cidreira? em que tília? levo o brilho e o teu encanto de fada. se um dia nos reencontrarmos na raiz de uma outra árvore, gostaria que me dissesses porque me escolheste, porque…
9h31
. estranhei nessa altura a falta que senti no peito só por saber que irias estar fora durante uns míseros quinze dias. quando voltaste da viagem trazias o brilho e o encanto das fadas e no meu peito plantaram-se sementes de cidreira e tília. odores que durante muito tempo o meu corpo misturava no sangue e no sopro, no verbo, no sémen. meu amado. quero-te tanto bem. tanta paz: meu gato invisível. não há nada de mais material que um gato etéreo. já passou muito tempo? demasiado tempo? ainda esta madrugada senti o teu corpo aninhar-se em mim na cama onde num plano outro, imenso e cerrado aos olhares profanos, posso comunicar com seres misteriosos, detentores de sabedoria, força, beleza, transparência. seres que também encontro na rua, a caminho dos seus esforços, das suas penas, sisífos arrastando as suas pedras na escalada da montanha. mas no sono de vigília que aprendi a ter, todos esses seres – o senhor do banco, a senhora da tabacaria, o motorista do táxi, o médico, aquele que anda de porta em porta de jornal na mão à procura de emprego – me aparecem em todo a sua grande glória e alvez. também tu gato, nascido não gerado, vivo não mortal, me apareces e revelas baixinho os segredos que te são permitidos revelar e que eu não decoro para te proteger do meu pensamento impuro
quando regressaste dessa viagem soube que te amaria para toda a vida. vida que acaba amanhã
o nosso amor cessa hoje,
estas palavras são a despedida. não as te
ria escrito se esta noite não me tivesses visitado e doado um silêncio tão fecundo para que tenha uma partida leve e dourada. diz-me, onde estarei amanhã depois da cessação do alento? em que cipreste? em que cidreira? em que tília? levo o brilho e o teu encanto de fada. se um dia nos reencontrarmos na raiz de uma outra árvore, gostaria que me dissesses porque me escolheste, porque…