terça-feira, fevereiro 07, 2006
tratado secreto da cidade # 35
# 35 – vigésimo quinto dia – 35 de dezembro – évora
19h32
em determinados dias [secreto calendário de invocação angélica], três igrejas fazem tocar os seus sinos em diálogo durante quase quinze minutos sem interrupção. tal como na idade média apenas sete sineiros-mestres sabem a melodia integralmente. melodia que invoca os anjos protectores da cidade. évora-ilha onde ainda ardem em terreiro de penitentes almas viventes e defuntas. os sineiros-aprendizes, que os fazem tocar, separam-se em grupos de três. três sineiros vezes três igrejas. seis sineiros-aprendizes como sinal da sua ainda imperfeita condição. cada grupo de três conhece apenas a parte musical que cabe à sua função. a melodia só tem poder quando as três igrejas tocam em sincronia. cada sineiro-aprendiz faz voto de silêncio. da sua boca jamais sairá a revelação de uma nota que seja. o que se sabe é o que se ouve. há ainda um sétimo sineiro-aprendiz. vigilante desse segredo e a responsável pela exacta sincronia dos carrilhões. um dia, se perseverarem, a cada um destes sete sineiros-aprendizes será conferido o grau de sineiro-mestre, através da comunicação integral da oração musical. a partir desse dia será função desse novo grupo de mestres encontrar outros sete aprendizes e garantir a continuidade do segredo. o toque organizado, vibrado que permite chamar à cidade os anjos que pelo sopro do seu abraço trabalharão sem descanso para que o tormento finde nesta ilha onde há séculos sem começo se trava um duelo de morte entre um vento de maldade e um vento de benignidade. não é difícil ver o amplexo que estes anjos gigantes oferendam a quem aqui permanece, às casas, aos animais, às sombras. às vezes as paredes enchem-se do sangue. vomitado de algumas criaturas que de tão exorcizadas perdem até o corpo. outras vezes há janelas que se partem, luzes que se acendem onde não há lâmpadas… nunca é vã a presença de um anjo protector. nem é vão o poder destes sinos. sob este chão está plantada uma árvore que só se erguerá à luz do dia no momento em que o duelo findar. aí terminará o trabalho dos sineiros. aqui. porque onde existir um grão de poeira a ocupar o espaço haverá duelos e anjos invocados. onde quer que exista uma partícula de vida haverá um sineiro fazendo vibrar a sua oculta melodia.
19h32
em determinados dias [secreto calendário de invocação angélica], três igrejas fazem tocar os seus sinos em diálogo durante quase quinze minutos sem interrupção. tal como na idade média apenas sete sineiros-mestres sabem a melodia integralmente. melodia que invoca os anjos protectores da cidade. évora-ilha onde ainda ardem em terreiro de penitentes almas viventes e defuntas. os sineiros-aprendizes, que os fazem tocar, separam-se em grupos de três. três sineiros vezes três igrejas. seis sineiros-aprendizes como sinal da sua ainda imperfeita condição. cada grupo de três conhece apenas a parte musical que cabe à sua função. a melodia só tem poder quando as três igrejas tocam em sincronia. cada sineiro-aprendiz faz voto de silêncio. da sua boca jamais sairá a revelação de uma nota que seja. o que se sabe é o que se ouve. há ainda um sétimo sineiro-aprendiz. vigilante desse segredo e a responsável pela exacta sincronia dos carrilhões. um dia, se perseverarem, a cada um destes sete sineiros-aprendizes será conferido o grau de sineiro-mestre, através da comunicação integral da oração musical. a partir desse dia será função desse novo grupo de mestres encontrar outros sete aprendizes e garantir a continuidade do segredo. o toque organizado, vibrado que permite chamar à cidade os anjos que pelo sopro do seu abraço trabalharão sem descanso para que o tormento finde nesta ilha onde há séculos sem começo se trava um duelo de morte entre um vento de maldade e um vento de benignidade. não é difícil ver o amplexo que estes anjos gigantes oferendam a quem aqui permanece, às casas, aos animais, às sombras. às vezes as paredes enchem-se do sangue. vomitado de algumas criaturas que de tão exorcizadas perdem até o corpo. outras vezes há janelas que se partem, luzes que se acendem onde não há lâmpadas… nunca é vã a presença de um anjo protector. nem é vão o poder destes sinos. sob este chão está plantada uma árvore que só se erguerá à luz do dia no momento em que o duelo findar. aí terminará o trabalho dos sineiros. aqui. porque onde existir um grão de poeira a ocupar o espaço haverá duelos e anjos invocados. onde quer que exista uma partícula de vida haverá um sineiro fazendo vibrar a sua oculta melodia.