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sábado, janeiro 28, 2006

tratado secreto da cidade # 27 

# 27 – noite sétima – dezembro – évora
para os actores do espectáculo «satirotic»,
karnart, lisboa, dezembro e janeiro de 2006,
éencenação de luís castro.
à memória de antónio botto


3h33

não é sonho. eles. sacerdotes negros. dirigem-se aos fiéis nas suas negras sotainas romanas. a velha águia do reich dos mil ânus vigia do alto encrostada numa moldura dourada. a velha águia do reich dos mil ânus observa o santo sacrifício do teatro. morramos, levantam-se os braços. caguemos, levantam-se as saias. bem-vindos à cremação das almas livres, à submissão dos corpos livres, à vestidura da negra oração que expulsa toda a luz e toda a luz absorve. meus irmãos e minhas irmãs caguemos. e o sacerdote, padre de roma levanta o braço, ergue-o em seta na direcção da águia e invoca num púlpito de lágrimas de sangue congelado as palavras da condenação. a última ceia. a ceia das velas que ardem em colunas com a virgem maria ao centro tentando re-guardar o seu menino, a rosa, a romã do seu ventre, escondê-la uma vez mais da águia que lhe sugou as veias. rapina nazi em cruzes de incêndio, fogueira sempiterna da roseacruz: latina voz de toda a paz. meus irmãos e minhas irmãs caguemos. como era no princípio é agora. primeiro o homem sentou-se e só depois de sentado cagou. assim meus irmãos vos ordeno, sentai-vos e cagai-vos uns aos outros como eu cago em vós enquanto me escorre pelas pernas o incontinente suco e odor do sémen cativo. há crianças escondidas em voos desesperados. marinheiros em terra e portas a cerrarem ventres de mulher.
ratos cegos roendo rolhas das garrafas dos reis da rússia. santificadas sotainas romanas que até em nados-mortos encontram pecados e penitências por cumprir. morramos para cristo, vivamos, sem semente ou óvulo, recostados nos seios sem leite da velha rata nazi. chupemos os finos lábios da rapina. selemos os orifícios do corpo com o lacre das suas homílias. chupemos irmãos, engulamos a seiva infectada com que ele nos esparge. sejamos nós os cegos ratos que hão-de corroer o sacro ofício do teatro. os mudos que repetem as palavras da danação. renunciemos em nome das sotainas negras e dos adúlteros rituais, a todo o amor, à claridade, à chama da paixão. afoguemo-nos na culpa de termos sempre culpa enquanto o navio que nos serve de arca não se afunda. se um dia a nossa pele tiver sentido o desejo de amar e os nossos sexos a vontade plena de se oferendar, que a pele nos seja arrancada e os sexos castrados e poemas apagados. não é roma o inverso evangelho de amor?
longe dos olhares profanos. no monte sagrado do sinai. dois meninos despidos das vestes de pele de cordeiro, tocaram-se pela primeira vez deitados na areia do chão. não conheciam nada, desconheciam a lua e o seu cristalino poder. sem ninguém os ver, jesus e joão reconheceram no calor dos seus olhos adolescentes a nudez verdadeira e tocaram-se sem medo. entrando um no outro um tornou-se o outro. mestre e discípulo, discípulo e mestre., longe do olhar profano, juraram, tendo só o deserto como testemunha, que o fluido de amor profundo que depositaram dentro deles através da sagração do sexo seria o princípio e o fim de todas as coisas, o alfa e o ómega. o verbo que é sopro. e desse encontro entre a carne de um e o espírito do outro, nasceu um filho, a palavra da verdadeira e única salvação. ao andrógino que brotou foi dado o nome de apocalipse. depois de cumprido só haverá amor em cada partícula do cosmo. disse jesus a joão. depois de cumprido só roma cairá do trono da vida em cada partícula do cosmo. disse joão a jesus. foi há muitos anos, no sagrado monte sinai longe dos olhares profanos.
chegou a hora.
durante o santo e sacro ofício do teatro, aos nossos olhos ardem as negras sotainas romanas enquanto do alto a rapina do reich dos mil ânus se desfaz em cinza de veneno. há um vento que anuncia o advento. e o cálice escondido está prestes a ser reencontrado. no graal o sangue e o sémen de jesus e joão prontos a se erguerem como uma espada inflamada. já tocaram os sinos da revelação.

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