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sábado, abril 16, 2005

quarenta romances de cavalaria # 35 

# 36 – quinta-feira

TEMOS QUE ESPERAR PELAS PALAVRAS tentar não desesperar enquanto elas não aparecem se entramos em pânico está tudo perdido é um processo lento se soubermos respeitar o silêncio entre cada letra a palavra surgirá basta um sinal de nervoso e perde-se tudo a primeira palavra contém sempre a semente da segunda e a segunda a semente da terceira e a terceira a semente da quarta e a quarta a semente da quinta a primeira palavra contém a semente da última não é preciso fazer nada é uma questão de calma gradualmente as sílabas formam-se as ideias espalham-se e sobre a terra vai-se formando o texto e então serão gritos e nuvens de algodão a entornarem-se no papel o medo esvai-se as flores ganham cheiro os corpos luz as cores deixam de ter nome e os animais família um romance é um advento mágico ou um fracasso primordial um poema é sempre um fracasso um conto é sempre um advento mágico há uma membrana de trevas entre nós e o desenho do texto que só é possível romper se mantivermos a calma e discernimento a ansiedade um mínimo tremor deitará ao vento todo o sonho de composição e geometria possíveis de encontrar numa narrativa o ideal é sofrer muito ter o coração despedaçado e as lágrimas já secas se possível o corpo doente e a alma perdida isso consegue-se é um objectivo como outro qualquer se engendramos alegrias e felicidade as palavras não comparecerão e o texto será dado como nado morto se for preciso podem cortar-se as veias e enquanto o sangue não sai todo e não se cai na dormência pré-mortal do suicídio pega-se na caneta e escreve-se muito depressa por esse meio todo um romance terá que ser escrito em segundos é possível fazê-lo pode-se tomar veneno e enquanto o fígado se destrói em pedaços aproveitam-se as dores para um primeiro verso com o veneno há mais tempo e bem gerido consegue-se escrever um poema inteiro desde que se prescinda das vírgulas e dos pontos mas é como já disse o ideal é já ter sofrido muito ter acumulado uma dor tão grande que as palavras emergem mesmo que as não queiramos é uma ciência não é uma arte depois é deixar que o deliro da derrota nos embale e tudo terá valido a pena_

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