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quinta-feira, março 17, 2005

quarenta romances de cavalaria # 7 

# 7 - quinta-feira

NÃO POSSO DIZER QUE TENHAMOS chegado tarde um ao outro quero explicar isto e é quase impossível quando descobrimos o nosso amor já as nossas vidas estavam separadas por vulcões tivemos que recorrer a um plano de consciência que nos permitisse habitar um lugar secreto dentro da terra se nesse lugar nos picássemos num prego aqui neste tosco areal de devoradoras bestas onde habitamos ordinariamente ninguém conseguiria ver a ferida por maior que ela fosse este amor provou-nos que é possível existir andar tomar banho em lagos de água quente ver cores que nunca ninguém viu sem o perigo da contaminação doente do bafo humano lá nem temos que ser humanos se bem que é nesses momentos de rosas e antiquíssimas araucárias de ametista que a nossa humanidade verdadeiramente se revela quando voltamos se é que voltamos os seres que nos rodeiam poderiam notar em nós alguns sinais dessas viagens de assombro mas para isso seria necessário que nos olhassem que sentissem o mais leve desejo de atenção sobre nós o que nunca acontece descobririam um brilho diferente nos lábios ou finíssimos jactos de luz saindo-nos dos olhos se alguém nos tocasse nas mãos verificaria que elas se abrem como asas mas essa hipótese está excluída ninguém nos observa delas apenas o ruído com que entopem as ruas e as casas e as camas até as nossas camas se alguém tivesse atenção quanto mais não fosse notaria como são felizes os nossos prolongados silêncios morreremos sem que vivalma se tenha apercebido do nosso cruzamento sem que o mais inteligente dos insectos tenha conhecimento deste nosso voo clandestino não posso esconder a dor de ainda não te conseguires lembrar destes átomos amorosos mas reconforta-me saber que aceites a verdade da sua realidade e digo que me dói porque eu lembro-me de cada instante de cada toque de cada mergulho nesse mar de invisibilidade e é por isso que cada regresso me é insuportável nessas alturas penso que deveria fazer cessar todos os sentidos e deixar-me petrificar cessar o impulso da memória cristalizar o cérebro com a violência irreversível de uma explosão intra-crâniana mas não posso não consigo tenho que voltar para ti dar-te o pó d'ouro e lápis-lázuli que apanho do chão todas as madrugadas para te oferendar viverei o tempo que for preciso eternamente um segundo horas para continuar a ter-te nessa casa distante onde nem os anjos ousam aproximar-se por não se sentirem suficientemente puros para estar ao nosso lado um dia teremos o tronco comum de uma araucária de ametista e poderemos enfim sangrar sem a prisão do regresso_

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