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quinta-feira, junho 10, 2004

a empresa # 28 

"the essential is no longer visible" - Heiner Müller

vejo-me barrado à entrada de um templo
sem mensura
à mercê dos anjos e das suas hierarquias
os mortos olham-me com as suas noites sóbrias
apalpam-me os dentes no roteiro das suas órbitas
rectificam-me o mênstruo
bebem o sangue com as mãos em concha
o tempo toca há lobos há raparigas
há a pedra do chão exterior
naquela paragem dos pés
há um transito planetário sobre o meu véu
e a luz está sem remédio atrás de mim
depositada nas mãos incendiárias de todos os felizes
e saudáveis comedores de conchas de chocolate
os verdadeiros e fieis profetas
os que sabem conhecem adivinham
o sabor doce de um amor preso
ao algodão das rochas das casas e dos sexos

os olhos dos anjos
– tão pequenos anjos de tão pequenos braços –
têm uma expressão forense
elíptica
em perfeito equilíbrio de fluidos
investigando os mais ínfimos detalhes do meu corpo exangue
há mesmo um minutíssimo pagem
que me lambe sabendo que não poderei responder
e depois desfalece
admito que feliz com o meu sabor de junho

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