domingo, fevereiro 01, 2004
A HORA DA FÉNIX 56
"the essential is no longer visible" - Heiner Müller
de um e-mail:
A Tempestade
"Contra o rochedo do paredão,
já eram prenúncio as ondas batendo,
enquanto sobre elas o vento gemia,
descendo da montanha,
silvando entre os eirados, sobre os socalcos ventosos;
o chiar sibilante dos fios de electricidade, o restolhar e esvoaçar das folhas,
a pequena lâmpada baloiçando e batendo dentro do candeeiro da rua.
Para onde foi toda a gente?
Vê-se na montanha uma luz.
Ao longo do molhe a maré começava a crescer
e as ondas, ainda não muito altas, mas quase,
vinham cada vez mais perto umas das outras;
cresce do mar uma densa névoa de chuva,
fazendo buracos na areia como se disparasse chumbo grosso,
o vento do mar e o vento da montanha em contenda,
destroçando a espuma das ondas e lançando-a na escuridão.
É tempo de correr para casa!
E a camisola suja de uma criança sai de rompante de uma rua e toma o caminho da subida;
um gato sai a correr de ao pé da janela, tal como nós,
entre as árvores já brancas um pouco acima de Santa Lúcia.
Onde a porta mais pesada volta a ser aberta
e é mais fácil o nosso respirar.
Depois, o ribombar de um trovão, e logo a chuva escura a cair sobre tudo,sobre
os terraços das casas, rajadas fustigando
as paredes, as portadas das janelas, obriga
o último observador a recolher,os jogadores
a concentrar-se mais nas cartas, as suas Lachryma Christi.
Vamo-nos chegando à cama, ao colchão de palha.
Ficamos à espera e à escuta.
A tempestade parece acalmar mas logo redobra,
quase faz inclinar as árvores até ao chão,
arranca as últimas e já mirradas laranjas do pomar,
destrói os frágeis cravos.
Uma aranha apressa-se a descer de uma lâmpada que baloiça,
corre sobre a colcha e esconde-se na armação da cama.
A lâmpada acende e apaga, cada vez mais fraca.
a água ruge na cisterna.
Nós ficamos muito juntos, agarrados à almofada,
respirando profundamente, à espera
que a última grande onda galgue o paredão,
que o estrondo seco das altas vagas se abata sobre a praia,
que se oiça o estremecimento súbito do imenso rochedo a despenhar-se
e o furacão devolva aos pinheiros ainda vivos as suas farpas"
theodore roethke
de um e-mail:
A Tempestade
"Contra o rochedo do paredão,
já eram prenúncio as ondas batendo,
enquanto sobre elas o vento gemia,
descendo da montanha,
silvando entre os eirados, sobre os socalcos ventosos;
o chiar sibilante dos fios de electricidade, o restolhar e esvoaçar das folhas,
a pequena lâmpada baloiçando e batendo dentro do candeeiro da rua.
Para onde foi toda a gente?
Vê-se na montanha uma luz.
Ao longo do molhe a maré começava a crescer
e as ondas, ainda não muito altas, mas quase,
vinham cada vez mais perto umas das outras;
cresce do mar uma densa névoa de chuva,
fazendo buracos na areia como se disparasse chumbo grosso,
o vento do mar e o vento da montanha em contenda,
destroçando a espuma das ondas e lançando-a na escuridão.
É tempo de correr para casa!
E a camisola suja de uma criança sai de rompante de uma rua e toma o caminho da subida;
um gato sai a correr de ao pé da janela, tal como nós,
entre as árvores já brancas um pouco acima de Santa Lúcia.
Onde a porta mais pesada volta a ser aberta
e é mais fácil o nosso respirar.
Depois, o ribombar de um trovão, e logo a chuva escura a cair sobre tudo,sobre
os terraços das casas, rajadas fustigando
as paredes, as portadas das janelas, obriga
o último observador a recolher,os jogadores
a concentrar-se mais nas cartas, as suas Lachryma Christi.
Vamo-nos chegando à cama, ao colchão de palha.
Ficamos à espera e à escuta.
A tempestade parece acalmar mas logo redobra,
quase faz inclinar as árvores até ao chão,
arranca as últimas e já mirradas laranjas do pomar,
destrói os frágeis cravos.
Uma aranha apressa-se a descer de uma lâmpada que baloiça,
corre sobre a colcha e esconde-se na armação da cama.
A lâmpada acende e apaga, cada vez mais fraca.
a água ruge na cisterna.
Nós ficamos muito juntos, agarrados à almofada,
respirando profundamente, à espera
que a última grande onda galgue o paredão,
que o estrondo seco das altas vagas se abata sobre a praia,
que se oiça o estremecimento súbito do imenso rochedo a despenhar-se
e o furacão devolva aos pinheiros ainda vivos as suas farpas"
theodore roethke