terça-feira, janeiro 27, 2004
HORA DA FÉNIX 54
a escrita é uma arma/eu bem dizia/tudo depende da bala/e da pontaria/tudo depende da raiva/e da alegria/a escrita é uma arma/de pontaria/há quem escreva por interesse/há quem escreva por escrever/há quem faça profissão de combater a escrever - a partir de poema de José Mário Branco
OS GAROTOS QUE SE AMAM
Jaques Prévert
Os garotos que se amam
beijam-se de pé
contra as portas da noite
e a gente que passa aponta-os a dedo
mas os garotos que se amam
não estão lá para ninguém
e é apenas a sua sombra
que palpita na noite
provocando a raiva de quem passa
a raiva, o desprezo, o riso e a inveja
Os garotos que se amam
não estão lá para ninguém
estão algures, muito além da noite
muito mais alto que o dia
na deslumbrante claridade do seu primeiro amor.
vi “le jour se lève”, de marcél carné, na abril em maio, sentado em cadeira de veludo, velho assento do teatro d. maria, agora banco de um cinema que não é cinema, aconchego de uma sala onde se pode fumar enquanto se vê o filme, onde se ouve a respiração apaixonada dos presentes, aí uns quinze. ali sentado, parado em mim, inundado do olhar desencantado de jean gabin, deixei-me, finalmente, descansar. na abril em maio ainda se consegue respirar e abraçar e beijar, ver livros, lutar. estar-se vivo. obrigada eduarda, obrigado maçarikus, obrigada prévert por teres estado presente.
“le jour se lève” - 1939
“num prédio parisiense, uma discussão entre dois homens azeda e é disparado um tiro. a vítima, valentim (lules berry), sai do pédio antes de sucumbir, e françois, o assassino (jean gabim), tranca-se no seu apartamento. a polícia cerca o prédio e, durante a noite, françois recorda o que se passou. operário numa fábrica, conhece françoise (jaqueline laurent), florista, educada como ele num orfanato. apaixonam-se, mas françoise recusa entregar-se. um dia ele segue-a até um music-hall, onde o número de um domador de cães (valentim) a seduz. clara (arletty), a amante de valentim, disposta a romper com ele, tenta seduzir françois, que se torna seu amante, enquanto que françoise se liga a valentim. este procura françois para o matar, mas acaba por não o fazer, aludindo cinicamente à sua ligação com françoise. furioso, françois pega na arma do outro e dispara contra ele. de madrugada, os polícias que cercavam a casa estão já no telhado; lançam gazes pela janela, mas françois já se suicidou com o revólver de valentim.”
“filme emblemático do realismo poético, “le jour se lève” é um clássico do péssimismo típico de marcel carné. construído com base num único personagem encerrado no seu quarto, o filme prolonga a tradição do “kammerspiel” do cinema alemão dos anos 20. é um filme inovador pelo recurso ao flash-back, que welles utilizará no ano seguinte em citizen kane.”
OS GAROTOS QUE SE AMAM
Jaques Prévert
Os garotos que se amam
beijam-se de pé
contra as portas da noite
e a gente que passa aponta-os a dedo
mas os garotos que se amam
não estão lá para ninguém
e é apenas a sua sombra
que palpita na noite
provocando a raiva de quem passa
a raiva, o desprezo, o riso e a inveja
Os garotos que se amam
não estão lá para ninguém
estão algures, muito além da noite
muito mais alto que o dia
na deslumbrante claridade do seu primeiro amor.
vi “le jour se lève”, de marcél carné, na abril em maio, sentado em cadeira de veludo, velho assento do teatro d. maria, agora banco de um cinema que não é cinema, aconchego de uma sala onde se pode fumar enquanto se vê o filme, onde se ouve a respiração apaixonada dos presentes, aí uns quinze. ali sentado, parado em mim, inundado do olhar desencantado de jean gabin, deixei-me, finalmente, descansar. na abril em maio ainda se consegue respirar e abraçar e beijar, ver livros, lutar. estar-se vivo. obrigada eduarda, obrigado maçarikus, obrigada prévert por teres estado presente.
“le jour se lève” - 1939
“num prédio parisiense, uma discussão entre dois homens azeda e é disparado um tiro. a vítima, valentim (lules berry), sai do pédio antes de sucumbir, e françois, o assassino (jean gabim), tranca-se no seu apartamento. a polícia cerca o prédio e, durante a noite, françois recorda o que se passou. operário numa fábrica, conhece françoise (jaqueline laurent), florista, educada como ele num orfanato. apaixonam-se, mas françoise recusa entregar-se. um dia ele segue-a até um music-hall, onde o número de um domador de cães (valentim) a seduz. clara (arletty), a amante de valentim, disposta a romper com ele, tenta seduzir françois, que se torna seu amante, enquanto que françoise se liga a valentim. este procura françois para o matar, mas acaba por não o fazer, aludindo cinicamente à sua ligação com françoise. furioso, françois pega na arma do outro e dispara contra ele. de madrugada, os polícias que cercavam a casa estão já no telhado; lançam gazes pela janela, mas françois já se suicidou com o revólver de valentim.”
“filme emblemático do realismo poético, “le jour se lève” é um clássico do péssimismo típico de marcel carné. construído com base num único personagem encerrado no seu quarto, o filme prolonga a tradição do “kammerspiel” do cinema alemão dos anos 20. é um filme inovador pelo recurso ao flash-back, que welles utilizará no ano seguinte em citizen kane.”