domingo, janeiro 04, 2004
HORA DA FÉNIX 41
"O fumo do meu lar, nas tardes nervosas de Outono, parece animado duma louca inspiração escultora de anjos e fantasmas." - Teixeira de Pascoaes
Recebi, "NIRVANA", por OLSA
Completos os ritos que celebravam a abertura do novo ciclo, ali fiquei. Ritos… ocultos? Sim poderei chamá-los assim. Mas apenas ocultos, porque ninguém mais os conhece a não ser eu; já que a veneração de símbolos está na natureza do Homem, então porque não adorar algo criado por nós mesmos, à nossa imagem e medida!?
Daquele modo, ali estava eu, passando da quinta hora daquele novo ano. Ao meu lado esquerdo, mais longe, a minha única companhia: o meu gato, cinzento… não de cor, mas por tal como eu ter em si o preto e o branco. Estava sentado, na sua pose imperial, olhando o vazio à sua frente, sem miar nada; uma estátua dalguma divindade egípcia tornada enfim carne!
Um véu cobria as estrelas, tingindo-se numa tonalidade nunca antes viste. Um pigmento inédito, algures entre o laranja e o roxo.
Esperava ansioso para celebrar a luz do novo dia. O «um» daquele ano que era trisexto, e tão especial para mim, pois de cem era um quarto: a antevéspera para o festejo da raiz do aquário desde sempre cúbico.
No entanto, as horas passavam, e nada se movia. Silêncio; quietude. Só eu percorrendo aquelas ruas vazias, só eu caminhando por aquele cimento e pedrinhas. Eu a única alma desperta, sob um céu imóvel.
Era como se o Sol se estivesse esquecido de acordar, tendo a Terra atravessado aquele ponto imaginário na sua órbita que marca a cada 365,25 dias um novo recomeçar, um baptismo involuntário para toda a Humanidade.
Seria possível? Ri-me como louco, a contemplar aquela possibilidade. Poderia a manhã nunca chegar naquela madrugada sem fim!? Seria então a derradeira testemunha daquele fenómeno bizarro, todos os outros dormiriam em suas vivendas apagadas… para sempre entregues nos braços aconchegantes de Morfeu, essa obscura entidade divina guardiã do paraíso e nossa tentadora.
O Tempo parara, sabia-o agora. Nada havia para além de mim, estava só, era tudo meu. Sentia-me eufórico, andando para frente e para trás naquele deserto de muros brancos. Por fim o nirvana que sempre desejei. Sem mais ninguém, eu ali era deus antes de criar.
Liberdade! Podia fazer tudo, podia fazer nada. Gritar, cantar, chorar, amar, morrer; era livre, era real. Eu era a única coisa real ali, naquele momento estagnado, eu era a única realidade; estava orgulhoso de mim, por fim satisfeito! Feliz.
Criei poemas no vento inexistente, canções demasiado virtuosas para a voz dos anjos, pintei telas de vazio. Apaixonei-me por quem havia desconhecido, e consenti-o! Se o quisesse podia ganhar asas e voar, regressar talvez a casa… sumir no nada; mas contentava-me apenas em correr tresloucado naquela madrugada infindável. Correr sem pudor, de alma nua.
Por fim, algo se moveu e se rasgou no firmamento, quebrando o encanto. Uma estrela surgiu tímida, envolta em negrume; e brilhou. O sortilégio havia sido desfeito, a normalidade voltara para me lembrara de tudo o que eu ainda não fizera. Sorri, de novo humilde, mas de alma satisfeita. Eu vira o tesouro, pelo qual era a minha demanda; provara um pedacinho do fruto que me fora prometido.
E quando os primeiros raios de sol me bateram na pele, em êxtase, gritei bem alto para todo o mundo: «Bom dia!!!».
OLSA
Recebi, "NIRVANA", por OLSA
Completos os ritos que celebravam a abertura do novo ciclo, ali fiquei. Ritos… ocultos? Sim poderei chamá-los assim. Mas apenas ocultos, porque ninguém mais os conhece a não ser eu; já que a veneração de símbolos está na natureza do Homem, então porque não adorar algo criado por nós mesmos, à nossa imagem e medida!?
Daquele modo, ali estava eu, passando da quinta hora daquele novo ano. Ao meu lado esquerdo, mais longe, a minha única companhia: o meu gato, cinzento… não de cor, mas por tal como eu ter em si o preto e o branco. Estava sentado, na sua pose imperial, olhando o vazio à sua frente, sem miar nada; uma estátua dalguma divindade egípcia tornada enfim carne!
Um véu cobria as estrelas, tingindo-se numa tonalidade nunca antes viste. Um pigmento inédito, algures entre o laranja e o roxo.
Esperava ansioso para celebrar a luz do novo dia. O «um» daquele ano que era trisexto, e tão especial para mim, pois de cem era um quarto: a antevéspera para o festejo da raiz do aquário desde sempre cúbico.
No entanto, as horas passavam, e nada se movia. Silêncio; quietude. Só eu percorrendo aquelas ruas vazias, só eu caminhando por aquele cimento e pedrinhas. Eu a única alma desperta, sob um céu imóvel.
Era como se o Sol se estivesse esquecido de acordar, tendo a Terra atravessado aquele ponto imaginário na sua órbita que marca a cada 365,25 dias um novo recomeçar, um baptismo involuntário para toda a Humanidade.
Seria possível? Ri-me como louco, a contemplar aquela possibilidade. Poderia a manhã nunca chegar naquela madrugada sem fim!? Seria então a derradeira testemunha daquele fenómeno bizarro, todos os outros dormiriam em suas vivendas apagadas… para sempre entregues nos braços aconchegantes de Morfeu, essa obscura entidade divina guardiã do paraíso e nossa tentadora.
O Tempo parara, sabia-o agora. Nada havia para além de mim, estava só, era tudo meu. Sentia-me eufórico, andando para frente e para trás naquele deserto de muros brancos. Por fim o nirvana que sempre desejei. Sem mais ninguém, eu ali era deus antes de criar.
Liberdade! Podia fazer tudo, podia fazer nada. Gritar, cantar, chorar, amar, morrer; era livre, era real. Eu era a única coisa real ali, naquele momento estagnado, eu era a única realidade; estava orgulhoso de mim, por fim satisfeito! Feliz.
Criei poemas no vento inexistente, canções demasiado virtuosas para a voz dos anjos, pintei telas de vazio. Apaixonei-me por quem havia desconhecido, e consenti-o! Se o quisesse podia ganhar asas e voar, regressar talvez a casa… sumir no nada; mas contentava-me apenas em correr tresloucado naquela madrugada infindável. Correr sem pudor, de alma nua.
Por fim, algo se moveu e se rasgou no firmamento, quebrando o encanto. Uma estrela surgiu tímida, envolta em negrume; e brilhou. O sortilégio havia sido desfeito, a normalidade voltara para me lembrara de tudo o que eu ainda não fizera. Sorri, de novo humilde, mas de alma satisfeita. Eu vira o tesouro, pelo qual era a minha demanda; provara um pedacinho do fruto que me fora prometido.
E quando os primeiros raios de sol me bateram na pele, em êxtase, gritei bem alto para todo o mundo: «Bom dia!!!».
OLSA