sexta-feira, dezembro 12, 2003
Do Stand-Up Tragedy
"O fumo do meu lar, nas tardes nervosas de Outono, parece animado duma louca inspiração escultora de anjos e fantasmas." - Teixeira de Pascoaes
STAND-UP TRAGEDY
Citação ou não
"Basta apenas uma mesma coisa para se ser um falhado ou um homem de sucesso: não ter medo do ridículo".
Ricardo Magalhães, humorista relutante
O primeiro abraço
Isto vem a propósito deste último post em que referi o texto do Frederico, que não conheço senão através do blogue, e que talvez nunca virei a conhecer. Se calhar até por causa do tal medo da desilusão, da sensação de conhecer alguém pelos seus textos e de perder esse conhecimento quando, no contacto pessoal, perceber que essa intimidade é uma ficção do leitor.
Depois de mencionar o texto do Frederico, dei comigo a pensar em muitas das reacções ao espectáculo que já pude testemunhar. Algumas, as que colocam dilemas e questões, as que procurámos provocar no exercício de manipulação e exposição que é sempre estar em palco a dizer coisas, algumas dessas reacções já foram citadas e debatidas neste espaço em textos anteriores.
Dei comigo a pensar na conversa que tivemos todos com o Nuno Artur Silva depois da ante-estreia. Com a capacidade cirúrgica que o Nuno Artur tem de analisar um texto, um espectáculo, um discurso ou uma ideia, tocou em dois ou três pontos fundamentais. Isto foi na quarta-feira, lá para a meia-noite, no bar do Maria Matos. No dia seguinte, a quinta feira de estreia, mudámos o final da peça por causa de ideias que surgiram nessa conversa com o Nuno Artur. Durante a tarde, eu, o Borges e o Costa Santos, continuámos a discussão iniciada com o Nuno Artur na noite anterior e surgiu um desfecho para a peça que é o ponto final que ainda não tínhamos inventado. Quem já viu, sabe do que falo.
Mas, apesar deste episódio, o que me ficou dessa noite foi o primeiro abraço que dei ao Nuno Artur. Conheço-o há poucos meses e desde então temos contactado bastante nas Produções Fictícias, com cortesia e simpatia, talvez até alguma empatia. Mas foi na euforia que se seguiu à ante-estreia, nas escadas que dão para o camarim 12, onde estou instalado, que nos abraçámos pela primeira vez. Ponho-me a pensar nisto e dou-me conta que não recordo a primeira vez que abracei qualquer um dos meus amigos. Aliás, não recordo a primeira vez que abracei qualquer pessoa na minha vida. Antes que isto se torne num libelo homossexual, deixem-me dizer-vos que foi um abraço, másculo, forte, entre dois homenzarrões. O Luís Borges e o Nuno Costa Santos estavam lá e foram testemunhas. Mas que havia ali alguma ternura, lá isso havia... TR
O(s) Ricardo(s)
Li o texto do Frederico, do blogue "saudades de Antero", que comoveu. Porque não é tão diferente como isso da minha própria experiência em relação a este personagem, o Ricardo, e a este espectáculo.
Também eu estreei no medo absoluto de me desiludir com a materialização daquilo que discutimos e fantasiámos durante meses.
Antes do espectáculo havia o blogue, antes do blogue havia a ideia, antes da ideia existíamos nós. Eu, o Luís, o Nuno, que inventámos esta coisa toda. A Magda que produziu. O outro Tiago que fez o cenário e as luzes. O Pedro da música e o Alfredo da voz off. Antes do SUT, havia isto tudo.
A única vez que tive a certeza de não me desiludir com este espectáculo foi quando dei o primeiro passo no palco, na noite da ante-estreia. Só aí tive a certeza de não me desiludir. Só aí tive a certeza que era impossível desiludir-me. Porque este espectáculo é, em última análise, aquilo que já existia em nós, antes do blogue e antes da ideia.
Pode ser formalmente mais interessante que outras coisas que fizemos ou venhamos a fazer, mas o que realmente o distingue do resto, é que foi feito por nós, do princípio ao fim. E isso está lá, visível, o tempo todo.
O que nós procuramos não foi encontrado e agora mostrado em forma artística ao espectador. Nada disso. O que nós procuramos é procurado em palco. Este espectáculo somos nós. E por isso é que não me desiludi. Ao contrário de qualquer espectador, quando subi ao palco, eu deixei de ter a possibilidade de escolher gostar ou não do Ricardo. Percebi que o Ricardo Magalhães era eu e os outros que fizeram isto. O Ricardo era nós. E eu nunca poderia desiludir-me connosco. TR
dúvida
Caro Frederico,
Depois de ler e reler a tua argumentação, percebi-o: qualquer das tuas opções é, na minha opinião, legítima. Permite-me, no entanto, que te diga: penso que devias aparecer no Maria Matos. Será interessante ver como é que o Ricardo Magalhães reagirá perante alguém que o conhece - que tem sobre ele uma ideia, uma expectativa. Que entra na sala com uma imagem e uma história fortes dentro da sua cabeça. Para além disso, partilhamos todos saudades de Antero. Talvez seja um motivo mais do que suficiente.
Até breve.
Um abraço
Nuno
STAND-UP TRAGEDY
Citação ou não
"Basta apenas uma mesma coisa para se ser um falhado ou um homem de sucesso: não ter medo do ridículo".
Ricardo Magalhães, humorista relutante
O primeiro abraço
Isto vem a propósito deste último post em que referi o texto do Frederico, que não conheço senão através do blogue, e que talvez nunca virei a conhecer. Se calhar até por causa do tal medo da desilusão, da sensação de conhecer alguém pelos seus textos e de perder esse conhecimento quando, no contacto pessoal, perceber que essa intimidade é uma ficção do leitor.
Depois de mencionar o texto do Frederico, dei comigo a pensar em muitas das reacções ao espectáculo que já pude testemunhar. Algumas, as que colocam dilemas e questões, as que procurámos provocar no exercício de manipulação e exposição que é sempre estar em palco a dizer coisas, algumas dessas reacções já foram citadas e debatidas neste espaço em textos anteriores.
Dei comigo a pensar na conversa que tivemos todos com o Nuno Artur Silva depois da ante-estreia. Com a capacidade cirúrgica que o Nuno Artur tem de analisar um texto, um espectáculo, um discurso ou uma ideia, tocou em dois ou três pontos fundamentais. Isto foi na quarta-feira, lá para a meia-noite, no bar do Maria Matos. No dia seguinte, a quinta feira de estreia, mudámos o final da peça por causa de ideias que surgiram nessa conversa com o Nuno Artur. Durante a tarde, eu, o Borges e o Costa Santos, continuámos a discussão iniciada com o Nuno Artur na noite anterior e surgiu um desfecho para a peça que é o ponto final que ainda não tínhamos inventado. Quem já viu, sabe do que falo.
Mas, apesar deste episódio, o que me ficou dessa noite foi o primeiro abraço que dei ao Nuno Artur. Conheço-o há poucos meses e desde então temos contactado bastante nas Produções Fictícias, com cortesia e simpatia, talvez até alguma empatia. Mas foi na euforia que se seguiu à ante-estreia, nas escadas que dão para o camarim 12, onde estou instalado, que nos abraçámos pela primeira vez. Ponho-me a pensar nisto e dou-me conta que não recordo a primeira vez que abracei qualquer um dos meus amigos. Aliás, não recordo a primeira vez que abracei qualquer pessoa na minha vida. Antes que isto se torne num libelo homossexual, deixem-me dizer-vos que foi um abraço, másculo, forte, entre dois homenzarrões. O Luís Borges e o Nuno Costa Santos estavam lá e foram testemunhas. Mas que havia ali alguma ternura, lá isso havia... TR
O(s) Ricardo(s)
Li o texto do Frederico, do blogue "saudades de Antero", que comoveu. Porque não é tão diferente como isso da minha própria experiência em relação a este personagem, o Ricardo, e a este espectáculo.
Também eu estreei no medo absoluto de me desiludir com a materialização daquilo que discutimos e fantasiámos durante meses.
Antes do espectáculo havia o blogue, antes do blogue havia a ideia, antes da ideia existíamos nós. Eu, o Luís, o Nuno, que inventámos esta coisa toda. A Magda que produziu. O outro Tiago que fez o cenário e as luzes. O Pedro da música e o Alfredo da voz off. Antes do SUT, havia isto tudo.
A única vez que tive a certeza de não me desiludir com este espectáculo foi quando dei o primeiro passo no palco, na noite da ante-estreia. Só aí tive a certeza de não me desiludir. Só aí tive a certeza que era impossível desiludir-me. Porque este espectáculo é, em última análise, aquilo que já existia em nós, antes do blogue e antes da ideia.
Pode ser formalmente mais interessante que outras coisas que fizemos ou venhamos a fazer, mas o que realmente o distingue do resto, é que foi feito por nós, do princípio ao fim. E isso está lá, visível, o tempo todo.
O que nós procuramos não foi encontrado e agora mostrado em forma artística ao espectador. Nada disso. O que nós procuramos é procurado em palco. Este espectáculo somos nós. E por isso é que não me desiludi. Ao contrário de qualquer espectador, quando subi ao palco, eu deixei de ter a possibilidade de escolher gostar ou não do Ricardo. Percebi que o Ricardo Magalhães era eu e os outros que fizeram isto. O Ricardo era nós. E eu nunca poderia desiludir-me connosco. TR
dúvida
Caro Frederico,
Depois de ler e reler a tua argumentação, percebi-o: qualquer das tuas opções é, na minha opinião, legítima. Permite-me, no entanto, que te diga: penso que devias aparecer no Maria Matos. Será interessante ver como é que o Ricardo Magalhães reagirá perante alguém que o conhece - que tem sobre ele uma ideia, uma expectativa. Que entra na sala com uma imagem e uma história fortes dentro da sua cabeça. Para além disso, partilhamos todos saudades de Antero. Talvez seja um motivo mais do que suficiente.
Até breve.
Um abraço
Nuno