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sexta-feira, novembro 21, 2003

O Pianista 

queria de ti um país de bondade e de bruma/queria de ti o mar de uma rosa de espuma - Mário Cesariny

O Nuno Costa Santos conta no Blog "Stand-Up Tragedy" esta extraordinária história:

"[...] conto a história de um outro fantasista, de um virtuoso do piano que fazia sonhar as pessoas, de um pianista, um pianista hoje caído no esquecimento, mas que foi muito famoso em Itália, sobretudo nos anos 50. Chamava-se Giafranco Conte e era um magnífico entertainer, capaz de tocar várias coisas – desde música italiana, à música clássica, ao jazz, passando pelo rock que, na altura, estava a surgir, dando a todos estes tipos de música um cunho italiano. Dava concertos em todas as cidades de Norte a Sul e enchia sempre as salas. Era adorado pelo país inteiro. No fim da vida, continuou também a tocar, mas tocava já com evidente dificuldade – esquecia-se, de vez em quando, das músicas e perdera toda a vivacidade. As pessoas continuavam a ir ver os seus espectáculos apenas por carinho e devoção para com a sua pessoa e começaram a circular rumores por toda a Itália de que “o Giafranco não estava nada bem”. Na imprensa anunciavam o fim da sua carreira de mais de 40 anos. A sua mulher, todos os seus amigos, o seu manager diziam que já não valia a pena continuar a fazer actuações ao vivo pois, desta forma, estava a pôr em causa a sua imagem de pianista genial. Ele era teimoso – negava-se a aceitar a incapacidade, a velhice. Um dia, Giafranco Conte, reconhecendo finalmente a sua debilidade física e mental, que o tornava incapaz de tocar bem, resolveu seguir o conselho de um amigo músico mais novo. Estávamos no fim dos anos 70. Giafranco passou a fazer playback. Sentava-se em frente ao piano numa sala cheia de gente e alguém punha uma bobine a funcionar. Imitava muito bem que estava a tocar. Fazia os gestos com as mãos e os dedos, as caretas todas e, no fim, levantava-se para a grande ovação. Enganou o país todo – afinal o Giafranco Conte estava de volta, em grande forma. Ninguém suspeitava de que aquilo que se ouvia não era som directo, mas sim a sua perfeita imitação. Numa noite em Verona, Giafranco sentiu-se mal. Começou a babar-se em cima do teclado e caiu sobre este. A música continuou a tocar. Alguém levantou-se indignado e gritou, mesmo vendo que o homem estava muito mal: “Isto é playback! Seu pulha!!!”. A música, essa, continuava a tocar e o pianista continuava com a cabeça mergulhada no teclado, já morto. O tipo que ligava e desligava a bobine tinha-se ido embora. À saída, as pessoas comentavam o sucedido de forma incrédula. Mas, poucos dias depois, circulava uma tese sobre o assunto entre os seus fãs: com a morte do pianista em palco, acontecera algo excepcional. Dera-se um fenómeno sobrenatural que transmitira o génio de Grianfranco Conte para o piano. O piano ganhara alma e vida própria – e era por isso que continuava a tocar. Os fãs negaram-se a aceitar os factos e quiseram prolongar a fantasia, criando uma lenda. Com a morte de Gianfranco em palco, o piano era agora o artista. Incorporara todas as qualidades do pianista e tornara-se capaz de tocar sozinho para uma multidão de fãs de Giafranco Conte. Ainda hoje, a casa onde nasceu o famoso pianista (em Parma) é visitada por imensos turistas e diz-se que, todas as noites, quando toda a gente está a dormir, o piano, já velhinho, ainda dá os seus concertos."

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