sexta-feira, novembro 28, 2003
HORA DO DIABO 16 - Um corpo contra a luz
queria de ti um país de bondade e de bruma/queria de ti o mar de uma rosa de espuma - Mário Cesariny
Diário de Imagens “Saudades de Antero”
O que é um homem?
De que é feito? De matéria, corpo-cérebro?
Corre sangue nas suas veias? Há sorrisos e paixões a atravessarem-lhe o corpo? Há nele corpo para ser atravessado?
Qual é o seu sexo?
Há sexo num homem?
(Sempre pensei o ser masculino como uma invenção e
o ser feminino uma criação.
O invento é uma acção do engenho, a criação um poder dos deuses.
É fácil compreender a forma masculina vista como um esqueleto, mas se lhe pusermos, carne e veias, nervos, tendões e pele, sobre tudo pele, torna-se numa massa abstracta. Num volume sem rosto. Numa trovoada de pensamentos e distorções.)
Como se move um homem?
Um homem move-se?
Como se toca um homem?
Um homem toca-se?
Como sofre um homem?
Um homem sofre-se!
Visto do universo, que cor tem?
As estrelas vêem-no?
Que acharão as estrelas?
Não! A princípio, um homem não tem corpo.
Um homem conquista o corpo.
Antes não há nada. Quando nasce não há nada num homem. Tudo é demoradamente conquistado. Construído. Um homem nunca pré-existe. Não conta com a vantagem de ter um principio.
Um homem não se sabe homem até se construir como tal.
Mas porque decide construir-se assim?
Quem decide?
A construção do cérebro é a mais dolorosa das etapas. É o momento em que se torna segmento, se separa do que tudo abrange e acolhe, do que tudo abraça. A conquista do cérebro, num homem, é a negação da concepção, do sopro da vida. É a assumpção do engenho e do suor. É um trabalho operário, solitário e lento.
Todavia, do suor do seu labor, pode, apesar de tudo, nascer um sol, mas um homem será sempre o corpo que contra a luz habita a sombra e mesmo nos momentos de morte, não é mais que um desejo de encarar a chama desse sol possível.
Esse desejo será sua eterna condenação, o passo atrás feito retrocesso, a consciência mortal de que os seus olhos não sabem olhar a claridade.
Um homem é um corpo contra a luz.
Diário de Imagens “Saudades de Antero”
O que é um homem?
De que é feito? De matéria, corpo-cérebro?
Corre sangue nas suas veias? Há sorrisos e paixões a atravessarem-lhe o corpo? Há nele corpo para ser atravessado?
Qual é o seu sexo?
Há sexo num homem?
(Sempre pensei o ser masculino como uma invenção e
o ser feminino uma criação.
O invento é uma acção do engenho, a criação um poder dos deuses.
É fácil compreender a forma masculina vista como um esqueleto, mas se lhe pusermos, carne e veias, nervos, tendões e pele, sobre tudo pele, torna-se numa massa abstracta. Num volume sem rosto. Numa trovoada de pensamentos e distorções.)
Como se move um homem?
Um homem move-se?
Como se toca um homem?
Um homem toca-se?
Como sofre um homem?
Um homem sofre-se!
Visto do universo, que cor tem?
As estrelas vêem-no?
Que acharão as estrelas?
Não! A princípio, um homem não tem corpo.
Um homem conquista o corpo.
Antes não há nada. Quando nasce não há nada num homem. Tudo é demoradamente conquistado. Construído. Um homem nunca pré-existe. Não conta com a vantagem de ter um principio.
Um homem não se sabe homem até se construir como tal.
Mas porque decide construir-se assim?
Quem decide?
A construção do cérebro é a mais dolorosa das etapas. É o momento em que se torna segmento, se separa do que tudo abrange e acolhe, do que tudo abraça. A conquista do cérebro, num homem, é a negação da concepção, do sopro da vida. É a assumpção do engenho e do suor. É um trabalho operário, solitário e lento.
Todavia, do suor do seu labor, pode, apesar de tudo, nascer um sol, mas um homem será sempre o corpo que contra a luz habita a sombra e mesmo nos momentos de morte, não é mais que um desejo de encarar a chama desse sol possível.
Esse desejo será sua eterna condenação, o passo atrás feito retrocesso, a consciência mortal de que os seus olhos não sabem olhar a claridade.
Um homem é um corpo contra a luz.