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sexta-feira, novembro 28, 2003

HORA DA FENIX 15 

queria de ti um país de bondade e de bruma/queria de ti o mar de uma rosa de espuma - Mário Cesariny

Diário de Imagens “Saudades de Antero”

"Fiquei intrigada com a míuda que ele escolheu para caminhar com ele e a forma como ela o fez. Ela tacteava a biqueira do sapato com o pé e colava-se a ele para coordenar movimentos como se tivesse feito sempre isso na vida, não se riu, confiou de tal maneira que pensei que eles já se conheciam antes. E conheciam?"

Ana Gonçalves, professora da Escola Secundária António Arroio, Lisboa


Cara Amiga,
Recebi esta frase de um e-mail seu.

Em relação a esse momento, gostaria de lhe endereçar umas palavras.

Para mim foi um momento estranhamente... como direi, excepcional.
Conheci aquela menina uns minutos antes da prática, à porta da sala do centro de recursos. Ela disse que era de Évora e vivia em Lisboa, eu disse que era de Lisboa e vivia em Évora, coisas assim. Mas, logo nesse momento, causou-me uma fortíssima impressão.

Lá dentro não fazia a mínima ideia onde ela se tinha sentado. Ainda por cima eu vejo muuuito mal mesmo com óculos, sem óculos, vejo assim uma espécie de amalgama colorida, juntando a isto a pintura dos olhos que me cola as pestanas e me impede de fechar as pálpebras com a cadência própria e humedecer os olhos. Quando entro em cena, naquela escuridão, tudo se passa num jogo de adivinhação, um jogo de desocultação em que tenho de aprender, em segundos, a "ver" por outros sentidos. Tenho sempre muito cuidado para não magoar ninguém, especialmente na parte em que se acendem as velas.

Quando percorria a sala, iluminando as mãos do público, tinha a preocupação de reconhecer alguém que à partida estivesse disponível para entrar no processo. Já quase no fim, uma rapariga deu-me a mão e olhou-me com o coração aberto, estava completamente embrenhada na imobilidade. Mas senti que não era ela, que tinha que continuar a procura. Arrisquei ir até ao acender da última vela, se não encontrasse “a” pessoa faria um qualquer jogo que me permitisse voltar atrás e ir buscar a outra menina. Mas quando peguei na última vela, sem olhar para o rosto de quem ma dava, constatei que a vela tinha um problema no pavio, que não consegui identificar. Olhei então para o "rosto" para pedir ajuda, era ela, também me olhava na imobilidade, decidi não acender a vela e aceitar a impossibilidade, era o sinal, Trouxe-a. A partir daí tudo foi inesperado e surpreendente, não houve estímulo a que ela não correspondesse, olhar que ela não compreendesse. Absolutamente mágico. No fim queria falar-lhe, mas ela fugiu. Como as fadas.

um fraterno abraço.

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